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segunda-feira, dezembro 31, 2007

sábado, dezembro 29, 2007

inglês técnico no seu melhor

Santa ignorância. Já não basta o provincianismo que levou a chanceler alemã a desatar à gargalhada nas costas de sócrates... Temos de ser ainda mais envergonhados por um primeiro-ministro analfabeto, incapaz de decorar umas simples frases em inglês que alguém teve tanto trabalho a escrever para ele. Ouçam com atenção e pasmem.
"very proud to be here in this moment cause this act is a (!) act that we do because a portuguese company do is outmost (?) to make technological possibilities to connect the two systems, the schengen system and the data systems of the new member states. That's a double proud for me (!!?): to be here like (?) the president of the councel but also to be here because a portuguese company dou (deu? do? ò analfabeto, é gave ou did) its contribution to more freedom for Europe." Atrás todos riem, e não é de espantar. E no fim aplaudem como se aplaude um atrasadinho que "discursou" na praça da aldeia. É triste, muito triste.
Não admira que o homem tenha retirado o inglês (prioridade só no discurso propaganda) do currículo do secundário dos cursos efa e tenha feito uma lei que praticamente impede os licenciados de inglês de ensinarem inglês ao primeiro ciclo, preferindo outros menos qualificados (e mais baratos). É que qualquer criança e adulto que frequente realmente algumas aulas (um feito de que sócrates aparentemente não se pode gabar) conseguirá falar melhor inglês do que o primeiro-ministro. E isso é inaceitável. Qualquer dia ainda se começam a rir quando ele fala. Como a chanceler Angela e os outros senhores da Europa...

O espaço infinito

Desde o século XV que os Europeus iniciaram um processo de Descobertas e de exploração do mundo desconhecido. Esse trabalho prolongou-se até aos finais do séc. XIX, com a exploração do último território desconhecido, o coração da África. Depois disso, quando o Ocidente se apercebeu que ainda só conhecia um terço do planeta, os olhares viraram-se para o fundo do mar. No tempo da Guerra Fria, começou também a exploração do Espaço, que teve o seu ponto alto em 1969 com os primeiros passos humanos na superfície lunar e que cada vez mais é uma prioridade. Mas há um outro espaço a exigir exploração atenta: a enorme vastidão da ignorância de josé sócrates. Em área e profundidade, excede o planeta e os mais fundos desfiladeiros marinhos.
Há alguns dias, uns governantes menores da "Europa" (exceptuando aqui a chanceler alemã) reuniram-se para celebrar com champanhe a abertura das fronteiras a leste. Fronteiras abertas entre a Alemanha e a Polónia e até ao Báltico. Nessa ocasião, sócrates discursou. Duvido que alguém tenha escrito o discurso para ele ler. Era algo tão mau e tão oco que só podia ser produto genuíno. Merecia até um selo de certificação (algo tipo made in UNI). Também não acredito que tenha sido um discurso espontâneo, fruto do momento e influenciado pelas bolhas do champanhe. Creio que sócrates perdeu realmente tempo a pensar no que iria dizer, o que aumenta a magnitude da tragédia. Talvez pensasse nisso enquanto se barbeava, ou durante o jogging. Ou numa viagem através da via do Infante.
E o que disse o auto-intitulado engenheiro não reconhecido pela Ordem? Que esta Europa unida e sem fronteiras é um sonho de muita gente, sobretudo da sua geração. Sem dúvida. Mas que isso para ele seja motivo de alegria é algo incompreensível. Quem foram os antigos "sonhadores" de uma Europa "unida" e "sem fronteiras"? Napoleão, no século XIX, Hitler e (à sua maneira) Estaline. Que sócrates goste da companhia de tiranos é já sabido, basta recordar como preferiu Mugabe e companhia a Gordon Brown. Birds of a feather flock together (traduzindo deste inglês técnico, diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és...).

Ronaldo e Ronaldinho

"El Barça debate sobre Ronaldinho, y no me extraña. Arrojar fuera a un jugador así es difícil. (...) Pero hace mucho que Ronaldinho no se entrena. Mucho, mucho. Y no he conocido en la vida caso alguno de persona que deje de trabajar por un tiempo considerable y sea capaz de volver a hacerlo con el interés y el entusiasmo requeridos. A Ronaldinho le quedan las faltas y algún pase magistral, pero el mejor Ronaldinho ya lo hemos visto.

Es duro admitirlo, pero es así. La primavera pasada tuve una larga conversación con Capello, en plena remontada del Madrid. Me dijo: "Con Ronaldo lesionado jugábamos mal, pero íbamos a dos puntos del Barça. Volvió él, jugó, y nos pusimos a ocho. Ahora se ha ido y estamos remontando". El Madrid ganó la Liga y sólo lamentó no haber tenido el valor de prescindir de Ronaldo en verano, cuando pudo hacerlo, y por más dinero. Ronaldo se fue al Milán y con un arreón de vago arrepentido marcó algunos goles el primer mes. Pero eso duró seis semanas. Después, nada. Y el Madrid es otro. "
Chieftains & The Corrs


I know my love by his way of walking
And I know my love by his way of talking
And I know my love dressed in a suit of blue
And if my love leaves me, what will I do?

chorus:And still she cried, "I love him the best,
And a troubled mind, sure can know no rest"
And still she cried, "Bonny boys are few,
And if my love leaves me, what will I do?"

There is a dance house in Maradyke
And there my true love goes every night
He takes a strange girl upon his knee
Well now don't you think that that vexes me?

chorus

If my love knew I can wash and wring
If my love knew I can sew and spin
I'd make a coat of the finest kind
But the want of money sure leaves me behind

chorus

I know my love is an errant rover
I know he'll wander the wild world over
In dear old Ireland he'll no longer tarry
An American girl he's sure to marry

chorus

Love song to a stranger

Esta música, composta em 1972 e inspirada numa relação pessoal de Joan Baez, é um exemplo simples e (talvez por isso) perfeito do olhar poético que a cantora/compositora tinha em relação à vida. Os versos contrariam também a afirmação que a poesia de Joan Baez era má, afirmação que própria Joan atribui a Bob Dylan na canção Diamonds and Rust ("my poetry was lousy you said"). O poema descreve momentos passados num hotel, local de um encontro amoroso que, na canção, durou dois dias. Ou uma noite (tudo o que importa se passou nessa noite). Tempo impossível para que os dois amantes se pudessem conhecer, o que acaba por justificar o título do poema, canção de amor para um estranho.
O poema começa com uma interrogação pessoal

"How long since I've spent a whole night
in a twin bed with a stranger
His warm arms all around me?
How long since I've gazed into dark eyes
that melted my soul down
To a place where it longs to be?"

A narradora encontra-se à deriva, errando por caminhos que desconhece. A sua alma gelada, petrificada pela falta de rumo, encontra o lugar que anseia no olhar negro do amante, e nesse instante sente-se a derreter e a escorrer em fios de água para esse lugar.
Do amante pouco ficamos a saber. O passado não se lê no seu rosto ("all of your history has little to do with your face"), diz a narradora, para prosseguir a descrição com um dos versos mais bonitos do poema

"You're mainly a mystery with violins filling in space"

Não consigo traduzir uma frase assim. Sou mudo em poesia. A tradução literal não nos faz sentir a melodia que ouvimos. Mas quem não gostaria de ser visto como um mistério tão encantador? Ser alguém com um passado feito de notas musicais em vez de factos, datas e memórias? Ao fim ao cabo, se o que transmitimos de nós aos outros é uma composição e não a realidade, por que não deixar a arte de (nos) compor para quem nos olha, se forem assim, capazes de fazer do nada uma harmonia?
Os versos seguintes descrevem gestos que a memória (tão selectiva) guardou, o amante levantando-se e recolhendo uma rosa de um ramo para a pousar na almofada. Olhando a rosa, ela adormece com uma só preocupação:

"To know that when day broke and I woke that you'd still be there"

Que o nascer do sol não a retire novamente do lugar que sente seu e a coloque novamente à deriva.

"The hours for once they passed slowly, unendingly by
Like a sweet breeze on a field
Your gentleness came down upon me and I guess I thanked you
When you caused me to yield
We spoke not a sentence and took not a footstep beyond
Our two days together which seemingly soon would be gone"
Nessa noite as horas deixaram-se arrastar, como uma brisa suave no campo, com os dois amantes em silêncio, conscientes do fim que se aproximava.
Chega então o maior lamento da amante, um grito de raiva e um rogo.
A descrença no amor eterno e (outros sonhos tristes) mostram uma visão atormentada da existência humana, descrita como uma vida de preocupações ("a lifetime of cares") da qual só conseguem ser resgatados os estranhos apaixonados. O amor, esse, não pode existir eternamente sem ser correspondido, porque se o é, pede a amante mais uma vida inteira, para aprender.

"Don't tell me of love everlasting and other sad dreams
I don't want to hear
Just tell me of passionate strangers who rescue each other
From a lifetime of cares
Because if love means forever, expecting nothing returned
Then I hope I'll be given another whole lifetime to learn"

Para aprender a quê? A corresponder ao amor que recebeu, a ser capaz de amar de volta, de dar ao outro em proporção do que recebeu.

"Because you gave to me oh so many things it makes me wonder
How they could belong to me
And I gave you only my dark eyes which melted your soul down
To a place where it longs to be"

O que me deste foi tão maravilhoso que chego a duvidar que me possa ter pertencido. E eu apenas te dei os meus olhos negros que derreteram a tua alma, fazendo-a deslizar para um lugar onde se sentisse em casa.

*
Texto completo aqui.

segunda-feira, dezembro 24, 2007

Feliz Natal

Feliz Natal, sacos de compras, guizos de renas, estrelas brancas em fundo vermelho, Feliz Natal e bom ano, bolo-rei, bolo-rainha, risos de crianças, que oferecer ao pai e à mãe, e a prenda da tia, ninguém se lembrou, mensagens no telemóvel, feliz natal, bom natal, boas festas, mensagens de email mas a caixa do correio vazia, esquecida, cheia de pó. Mesmo assim, feliz natal, brinquedos para as crianças, livros para quem lê, cds para quem gosta de música, tudo caro, tudo bertrand e fnac e loja da esquina, embrulhos feitos em casa, sem as etiquetas dizendo feliz natal, prendas que falam por nós, feliz natal feliz natal, peru ou bacalhau, vinho do porto, bolo-rei, doces e cadeiras vazias de familiares que não estão, que já não estão ou que não podem estar e que estão sozinhos noutra casa, com água a escorrer quando chove e frio soprado pelo vento nas entranhas abertas das paredes velhas, feliz natal mesmo para eles e para mim e para vocês.

White Christmas


( Fotos AS)

quarta-feira, dezembro 19, 2007

Ler nas entrelinhas

"É verdade, sou um provinciano, fiz-me sem pedir nada a ninguém. Não tenho aliados entre os grandes pensadores portugueses e a aristocracia de esquerda."
(josé sócrates, no Liberation, citado pelo Público online)
Tradução: Sou um boçal. "Licenciei-me" sem que ninguém me ensinasse nada. Não sou respeitado pelos grandes pensadores portugueses [o que, tendo em conta que é josé sócrates a falar, abarca 99% da população, incluindo muitos formandos EFA] nem por Mário Soares e Manuel Alegre.

terça-feira, dezembro 18, 2007

bring 'pride' back to England

Capello é uma excelente escolha para seleccionador de um país que promete sempre tanto e que acaba por desiludir. A pátria do futebol merece o melhor treinador no activo.

domingo, dezembro 16, 2007

Artigos a (re)ler

J. P. Coutinho, "A minha vingança" e J.P.Pereira, "O Meio"

ALERTA: Estupidez aumenta na Europa

Quando se espera que a estupidez típica do pensamento politicamente correcto não fosse capaz de descer a níveis ainda mais profundos, surge sempre alguém a quebrar barreiras. Desta vez o prémio de idiotice politicamente correcta deve ser dado a umas senhoras soldados (soldadas, mulheres soldado? seja lá o que as ditas forem) suecas. O símbolo do batalhão do qual fazem parte era este leão:
Aparentemente, as referidas senhoras ficaram ofendidas com a presença dos genitais do leão e levaram o "caso" (?) a tribunal. Como hoje em dia as leis europeias têm por norma a procura do absurdo, em vez de aplicar uma pena às queixosas por ofensas aos símbolos militares nacionais, o tribunal deu-lhes razão (!) e obrigou o exército a submeter o leão a uma operação informática, cujo resultado final é este:

Já várias vozes levantaram a questão mais óbvia e racional: o facto de não aparecerem os genitais não torna este leão num ser assexuado, já que a JUBA é exclusiva do leão macho!!! Burras!!! E burros que foram na conversa!
Mas como a razão não é para aqui chamada (há muito que deixou a Europa navegando pelo Atlântico) agora temos as senhoras militares suecas e os senhores militares suecos de consciência limpa, com um leão eunuco como símbolo. Presumo que, com isso, pretendam derrotar os inimigos pelo riso. E há por aí gente que quer fazer da Suécia um exemplo...
____

sexta-feira, dezembro 14, 2007

60 anos de miedo escénico


O Santiago Bernabéu faz 60 anos hoje. Na feliz expressão que Valdano popularizou, este estádio provocava (e provoca) miedo escénico (medo do palco) a quem vem actuar nele. Equipas que tinham vencido os Blancos por um resultado que julgavam confortável chegavam a Madrid, entravam no estádio e, de repente, as tremuras nas pernas, o ruído ensurdecedor do público. Do outro lado da linha de meio-campo, o Real Madrid, onze atletas que chegaram onde todos os outros ambicionam chegar. A confiança dá lugar à dúvida. Quando a partida começa, os adversários percebem que actuar ali não é o mesmo que actuar em qualquer outro local. Há uma alma naquele palco que emudece, seca as bocas destes pobres actores que vêm de fora. As frases de comando não soam, a cortina sobe e os actores contemplam o abismo. O texto esquecido. Branco. Blancos. Como as camisolas dos verdadeiros actores e donos do palco. 1-0. 2-0. 3-0. 4-0. 5-0. 6-0. As famosas remontadas que fazem também elas parte do mito e da História do Real Madrid, do enredo de uma magnífica obra épica. Os visitantes, que entraram julgando-se actores, deixam relvado com a consciência de terem sido, afinal, testemunhas e figurantes. Derrotados, não deixam de lembrar o momento com orgulho. Estiveram lá. Viram e sentiram a alma do Bernabéu. Tem mais valor cair em Madrid do que ter sucesso em qualquer outro local. Tem sido assim ao longo de 60 anos. E continuará a ser.

quinta-feira, dezembro 13, 2007

Fazer História

A sessão de encerramento do circo do Tratado de Lisboa teve a presença de Dulce Pontes. Agindo em nome de todos os europeus anónimos e conscientes, Dulce Pontes fez o possível para rebentar os tímpanos dos políticos presentes. No entanto, esqueceu-se que eles são surdos há muito tempo. Muitos também são cegos. Só não são, infelizmente, mudos, como demonstrou josé sócrates ao fazer um longo e bocejante discurso, sem uma frase interessante, sem uma ideia, sem uma centelha de pensamento que não ultrapassasse a banalidade. "É um tratado que ficará na História." Ninguém duvida. Com sorte, nunca passará de uma nota de rodapé. Mas se tudo correr tão mal como se prevê, o tratado ficará na História. Infelizmente, pelos piores motivos. É que a História que sócrates pretende escrever (ou pretenderia, se soubesse pegar numa caneta) está cheia de tratados inúteis ou de trágicas consequências. Basta consultar uma História da Diplomacia. Ou falar de Versalhes a um alemão e a um francês.

Campeão do Mundo de Acordeão


Afinal, também temos talentos em Portugal. João Barradas tornou-se Campeão do Mundo a tocar acordeão. Com apenas 15 anos, o João conseguiu, finalmente, chegar ao topo do Mundo após ter sido várias vezes campeão nacional e ter ganho vários prémios internacionais.
Para ouvir este pequeno génio:

quarta-feira, dezembro 12, 2007

Fado em Si bemol

Hoje, quarta-feira, estava sentado no meu sofá a ver um filme quando algo me atrai a atenção na televisão. Era o Pedro Matos a cantar em directo um fado num estilo predominantemente "jazzistico". Simplesmente fantástico. Para quem não sabe, o Pedro cantava no mesmo coro que eu. A grande diferença é que ele canta enquanto eu no coro apenas participava porque gostava do ambiente que se criava (coro com mais de 100 pessoas) e apenas traulitava umas notas e passava o tempo a avaliar os dotes vocais dos participantes. O Pedro era um caso único. Com uma voz fabulosa destacava-se de todos os demais e arrepiava qualquer um quando cantava a solo. Pois, ele canta tão bem, que nos concertos tinha sempre um momento para brilhar a solo. Pensava para mim: "este ganhava uma operação triunfo com uma perna às costas". Indignava-me saber que ele era tão dotado e não se dar a conhecer a um publico mais vasto. Felizmente, e sem ter conhecimento, o meu agradável espanto quando o vejo a brilhar na TV. Acabou de produzir um CD "Fado em Si Bemol" que vai ser lançado em Janeiro no mercado. Os músicos que o acompanham são excelentes. Este rapaz vai longe...
Gostos não se discutem mais oiçam e vejam algumas músicas que estão no Youtube, informações sobre o grupo e depois comentem...

terça-feira, dezembro 11, 2007

3...6...

"Otto Dix retratou, nas suas ilustrações, a guerra das três seis..."
Como? perguntam vocês, como perguntei eu também, olhando incrédulo para a folha de exercício. Voltei à folha das perguntas. Será que me enganara na questão, no aluno, na turma, na profissão (sim, certamente na profissão)? Mas depois, recordei a velha regra de quem corrige testes e textos escritos por gente que nunca leu um texto e que, por esse motivo, nunca viu as palavras que ouve. Limita-se a reproduzir os sons da forma que acredita ser o mais fiel possível. Desta forma surgem expressões memoráveis, como o incontornável "sequeso" ou o fantástico "água a que se diz nada" (sexo e água oxigenada, respectivamente). Quanto à "guerra das três seis", é obviamente (sublinho, obviamente) a "guerra das trincheiras."

Doutores e engenheiros

É com tristeza que comunico ao auditório o nosso 37º lugar no PISA. O programa da OCDE que persiste em enxovalhar-nos não ficou impressionado com os nossos conhecimentos científicos, linguísticos e matemáticos. Entre 57 países, ocupamos a terceira parte da lista, abaixo da média e muito atrás da Finlândia, que continua a liderar o barco. Como explicar esta sazonal desvergonha? O Ministério da Educação, em atitude que se aplaude, não cede ao populismo fácil de quem aconselha mais estudo nas referidas matérias. Para o Ministério, o problema está na 'disfunção' do sistema, que persiste em 'reter' os nossos jovens quando a atitude mais sensata seria aprová-los com distinção. Nas palavras corajosas de Jorge Pedreira, secretário de Estado-adjunto, "a retenção não é normal" (Freud, naturalmente, discordaria). Espera-se que o Ministério aprenda a lição e, a partir do próximo ano, faça o que lhe compete: no início da escolaridade obrigatória, entregar a cada criança um diploma universitário. E depois enviar o retrato para a OCDE. Se o PISA não se espanta com um país de poetas, talvez respeite um Portugal precocemente coberto por doutores e engenheiros.
João Pereira Coutinho

domingo, dezembro 09, 2007

A voz

"Mas a canção que se seguiu penetrou-me bem fundo no coração - era uma canção triste, guitarras e palavras tristes, uma rapariga americana cantando uma composição intitulada «Barbara Allen».
Que voz aquela! Nem precisava de música; quase não precisava de palavras. Ela própria criava a melodia; ela, só, bastava para criar todo um universo de sentimentos. Era isso o que as pessoas da nossa comunidade [indiana] procuravam na música e no canto - sentimentos. Era isso que nos fazia gritar «Wa-wa! Bravo!» e atirar notas e coisas em ouro para um cantor. Ao ouvir aquela voz, senti a parte mais profunda de mim mesmo acordando, aquela parte que conhecia a perda, as saudades, a mágoa, aquela parte que ansiava pelo amor. E naquela voz havia uma promessa de esplendor para todos os que a ouviam.
- Quem é a cantora? - perguntei a Indar.
- Joan Baez - respondeu ele. É muito famosa nos Estados Unidos.
(...)
...regressei à voz. Nem todas as canções eram como «Barbara Allen». Algumas eram modernas, falavam da guerra e da injustiça, da opressão e da destruição nuclear. Mas havia sempre melodias antigas, melodias ternas. Eram essas melodias que eu queria ouvir, mas no final a voz juntava os dois tipos de canção, juntava as donzelas e os apaixonados e as mortes tristes dos tempos passados com a gente dos nossos dias, a gente oprimida, a gente que ia morrer.
Tudo aquilo era fingido, não tinha a mínima dúvida. Só quem confiava na justiça, só quem tinha acesso à justiça, é que poderia ouvir canções ternas acerca das injustiças do mundo."

(V. S. Naipaul, A Curva do Rio, D. Quixote, pp. 159-161.)

quinta-feira, dezembro 06, 2007

O direito à beleza

«A Primeira Guerra Mundial foi importante para a emancipação feminina porque a guerra veio dar trabalho / emprego às mulheres [que] assim tiveram mais direitos como o uso de decotes, saias pelos joelhos, começarem a vir tratamentos ou melhor maquilhagem e perfume, o primeiro perfume foi o chanel.»
.
(eu tenho a impressão que não foi isto que eu ensinei... e depois vêm dizer que a culpa é minha...)

segunda-feira, dezembro 03, 2007

Os loucos IV

Triste sina a de ser quem não se é. Uma mente, um coração, uma alma, chamem-lhe o que quiserem, e o corpo errado. O desejo trocado. Na adolescência, a imagem no espelho confundida com a idealização do desejo. Narciso? Não. Narciso, o pobre Narciso, apaixonou-se pelo seu reflexo. E morreu assim. Teve sorte. Além disso, os tempos eram outros, o Olimpo e a imaginação dos homens antigos eram mais livres e acolhedores. Pelo menos nessa questão dos amores trocados. O rapaz era capaz certamente de contestar estas palavras. Nem os amores estão trocados, ele sente-os como certos, logo o erro não estará nele, mas no mundo que o rodeia. É um daqueles casos em que todos os outros estão errados, não ele.As angústias passadas nunca foram reveladas. Mas não terão sido poucas. Desde logo, a dificuldade de aceitar como se é e de aprender a olhar o mundo visto ao espelho quando todos os outros o continuam a ver naturalmente. A esquerda dele a direita dos outros, o sim a soar não aos outros, o riso dos outros a gerar lágrimas nele. Depois, quando esse processo de auto-aceitação ficou feito, veio o outro problema. O de explicar ao mundo com se é e fazer o mundo aceitar. Não tinha sequer de apoiar, bastava pelo menos que ignorasse a questão, que aceitasse esse facto como se aceitam os olhos azuis, os caracóis, a voz rouca, o frio do Inverno, a escuridão das noites sem luar e todas as outras loucuras (nada mais do que desvios de uma norma que todos parecem contestar mas que todos aceitam e aplicam, mesmo contra si). A verdade é que os mais próximos aceitaram pior. Mas, curiosamente, entre os loucos o problema nem se colocou. Mesmo que haja excepções, não foram traduzidas em gestos ou palavras. E é quase certo que o rapaz encara o asilo de loucos como um dos lugares mais sãos que poderia encontrar, um abrigo onde continua a não poder ser quem é, onde continua a ser uma mente, um espírito, uma alma, chamem-lhe o que quiserem, escondido no corpo errado, mas onde ninguém lhe lembra do que deveria ser.

Os loucos III

O homem entra na sala. Um homem alto, lembrando uma marioneta desajeitada, os pés tropeçando no vazio, hesitando antes de pousarem no chão, o olhar indeciso, saltitando por toda a divisão, não à procura de alguma coisa, mas procurando evitar um contacto mais longo com outro olhar. O homem encontra um canto onde se consegue isolar. Senta-se, as pernas longas bem juntas, o tronco um pouco estendido para a frente. Os olhos pousam no chão, cansados da fuga anterior, repousam, ganham fôlego. E começam a erguer-se novamente. Ninguém lhe prestou atenção. Os restantes loucos derivam isolados ou balbuciando frases ocas em grupos. Os olhos são claros, e brilham de uma forma que não se esperaria na figura baça. Há ali uma fogueira interior que arde, queima e liberta aquele brilho. Esse fogo é a sensação de abandono e desadaptação. O homem não pertence aqui. As frases que ele balbucia não soam iguais às dos outros. O que lhe desperta a atenção é para os outros algo de estranho e hermético. Os outros pensam com palavras, ele pensa com números e relações de valores. Por isso as palavras lhe surgem com dificuldade. As perguntas que faz revelam uma inocência típica de um estranho. Para que serve…? Como se faz…? O que significa…? E, complementando as frases interrogativas, realidades tão claras como o amanhecer e o entardecer e a água da chuva e do mar junto à ilha verde. Dúvidas de criança. A cada momento esperamos que pergunte “de onde vêm os bebés?”
Quando encontra alguém com quem consegue conversar, convertendo mentalmente equações em orações antes de falar, o tema é sempre o mesmo. E nessa altura sentimos que o problema dele não é o de não pertencer ali, é algo mais profundo e dilacerante. Não é um fogo, mas uma chaga em carne viva, escorrendo sangue numa hemorragia imparável. E ainda assim os olhos brilham quando fala de outra terra, para onde deseja ir, de onde veio, e da filha que lá deixou. “Há muito tempo que não a vejo, Tenho saudades da minha filha, há muito tempo, há mais de dois dias, quase há uma semana. Tenho de ir. No fim do dia, hoje é sexta, não é? A minha filha, linda, não a vejo e sinto saudades.” E o interlocutor “era bom que fosse sexta, mas ainda é quarta-feira” e o brilho do olhar esmorece, a voz mais ténue por uns momentos, ganhando forças para continuar, como os olhos no chão recuperando o fôlego. “É que não a vejo há tanto tempo. De certeza que não é sexta-feira?”, e o outro já nem estranha a pergunta infantil. “de certeza, é quarta-feira.” “Mesmo assim, mesmo assim vou a casa. É uma viagem longa, vou pedir autorização e de certeza que me deixam ir, se lhes explicar que vou ver a minha filha, é impossível que não me deixem sair mais cedo, têm de compreender.” Enquanto fala, o seu braço direito retorce-se involuntariamente, a palma da mão vira-se para cima e os dedos curvam-se, formando uma concha. Este gesto, de tão habitual, tornara-se já conhecido, fazendo rir quem o observa. Mas desta vez o outro não se riu. Limita-se a encolher os ombros. “Por mim podes ir, creio que ninguém se importa.” E levanta-se, subitamente incomodado pela conversa, pois é do conhecimento geral que a filha não existe a não ser na mente do homem, um desesperado elo que ainda o liga ao mundo que já não é o seu.
O homem parece nem notar a súbita partida do seu companheiro de conversa. “Há tanto tempo que não a vejo, que vontade de a segurar, assim” e de novo o gesto a repetir-se, traços que restam de carinhos passados.

domingo, dezembro 02, 2007

o lambe-botas

Que o pseudo-engenheiro não tem formação, é já um dado adquirido. E que lhe falta também educação, há muito que se suspeita. Mas uma imagem e um gesto valem por mil palavras. Vejam como a ânsia de lamber as botas aos governantes estrangeiros o leva a ignorar uma pessoa (não importa quem) com quem falava inicialmente. Um gesto que diz tudo E é esta criatura sem educação que nos desgoverna...
(apressem-se a ver antes que o vídeo seja censurado no tube).

domingo, novembro 25, 2007

Com um brilhozinho nos olhos


Com um brilhozinho nos olhos

e a saia rodada

escancaraste a porta do bar

trazias o cabelo aos ombros

passeando de cá para lá

como as ondas do mar

conheço tão bem esses olhos

e nunca me enganam

o que é que aconteceu diz lá

é que hoje fiz um amigo

e coisa mais preciosa no mundo não há


Com um brilhozinho nos olhos

metemos o carro

muito à frente muito à frente dos bois

ou seja fizemos promessas

trocámos retratos

traçámos projectos a dois

trocámos de roupa trocámos de corpo

trocamos de beijos tão bom é tão bom

e com um brilhozinho nos olhos

tocámos guitarras

pelo menos a julgar pelo som


E o que é que foi que ele disse?

E o que é que foi que ele disse?

Hoje soube-me a pouco

Hoje soube-me a pouco

Hoje soube-me a pouco

Hoje soube-me a pouco

passa aí mais um bocadinho

que estou quase a ficar louco

Hoje soube-me a tanto

Hoje soube-me a tanto

Hoje soube-me a tanto

Hoje soube-me a tanto

portanto

hoje soube-me a pouco


Com um brilhozinho nos olhos

corremos os estores

pusemos o rádio no on

acendemos a já costumeira

velinha de igreja

pusemos no off o telefone

e olha não dá para contar

mas sei que tu sabes

daquilo que sabes que eu sei

e com um brilhozinho nos olhos

ficámos parados

depois do que não te contei


Com um brilhozinho nos olhos

dissemos sei lá

o que nos passou pela tola
(tudo o que nos caiu no goto)

do estilo: és o number one

dou-te vinte valores

és um treze no totobola

(és um seis no meu totoloto)


e às duas por três

bebemos um copo

fizemos o quatro e pintámos o sete

e com um brilhozinho nos olhos

ficámos imóveis

a dar uma de tête a tête


E com um brilhozinho nos olhos

tentámos saber

para lá do que muito se amou

quem éramos nós

quem queríamos ser

e quais as esperanças

que a vida roubou


e olhei-o de longe

e mirei-o de perto

que quem não vê caras

não vê corações

e com um brilhozinho nos olhos

guardei um amigo

que é coisa que vale milhões


(S. Godinho)

A boa gestão governo socialista

"Advogado contratado duas vezes
O ministério da Educação contratou duas vezes o mesmo advogado para fazer o mesmo trabalho. No primeiro contrato, o advogado João Pedroso comprometia-se a fazer um levantamento das leis sobre a Educação e ainda a elaborar um manual de direito da Educação. O trabalho deveria estar concluído até Maio de 2006, mas tal não aconteceu. Apesar de não ter sido concluído nos prazos previstos, o advogado recebeu a remuneração.
Ainda assim, o ministério fez depois com João Pedroso um novo contrato com os mesmos objectivos, mas a pagar uma remuneração muito mais elevada. Em vez dos iniciais 1500 euros por mês, João Pedroso passou a receber 20 mil euros/mês.
Perante estes factos, o ministério da Educação justifica-se dizendo que os objectivos do primeiro contrato não foram cumpridos por erro de avaliação. O secretário-geral do ministério assume as responsabilidades da tutela. Ao Rádio Clube, João da Silva Baptista diz que o ministério não soube avaliar o volume de trabalho que entregou à equipa liderada por João Pedroso da primeira vez.
Por causa do erro de avaliação, o ministério da Educação acabou por ficar sem possibilidade de exigir a João Pedroso para acabar o trabalho pelo qual foi pago e decidiu por isso pagar mais e renovar o contrato. João Pedroso, contactado pelo Rádio Clube, recusou comentar os contratos que assinou com o ministério da Educação, remetendo todos os esclarecimentos para o Governo.
Uma notícia Rádio Clube investigada pelo jornalista Nuno Guedes."
.
Quando se diz "o ministério não soube avaliar o volume de trabalho..." quem é que se está a esconder? Que eu saiba, o "ministério" é uma entidade abstracta, sem capacidade para avaliar seja o que for. Quem foi o incompetente? Que penalização vai ter? E se se tratou de um erro de avaliação, só pode ter sido em relação aos prazos estabelecidos? Nesse caso, como justificar a fantástica subida salarial? O sr Pedroso vai fotocopiar toda a legislação emitida pelo ministério pagando do seu próprio bolso e pagar uma edição de autor com a compilação feita?
E é esta gente incompetente que legisla sobre educação e avalia profissionais formados para exercerem as suas funções? Com que legitimidade vem o ministério exigir resultados às escolas, se eles próprios são tão incompetentes e, ao mesmo tempo, benevolentes com os seus próprios erros "de avaliação" (um eufemismo para incompetência)? É que, caso não tenham reparado, os objectivos traçados pelo ministério são tão ridículos e utópicos (nas actuais condições) que podem ser considerados "erros de avaliação" (se o julgamento que fizermos for brando).
Ah, presumo que o facto de João Pedroso ser familiar do socialista Paulo Pedroso nada tenha a ver com a sua contratação e remuneração faraónica.

domingo, novembro 18, 2007

Eis alguém que, claramente, não sabe do que está a falar. E é pago para o fazer. Meu Deus, será o expresso um jornal estatal?

A socialista

Num almoço, falando-se das oportunas mudanças da lei que protegem (oh coincidência) suspeitos politicamente importantes num processo que decorre ainda nos tribunais, alguém diz: "vê-se logo que o governo é socialista." A senhora exalta-se. Uma generalização abusiva, afirma. Estava dado o mote. Uma mesa inteira expôs argumentos sobre a falta de honestidade e a arrogância socrática, sobre o controlo da comunicação social (e a forma como esta se aninha no confortável colo socialista), sobre a incompetência gritante do governo, sobre a ausência de pudor e de culpados em tudo o que são desvios de dinheiros públicos... A tudo isso a senhora defendia-se com um único argumento. O sr Sócrates e os socialistas não são os únicos a fazer isso.
Quando o único argumento de defesa de uma simpatizante política é "os outros também o fizeram e também são beneficiados", não há necessidade de argumentar mais. Está lá o peso na consciência, a noção que os seus agiram e agem mal. Sobre a pseudo-licenciatura, afirmou: "vocês não podem negar que ele é engenheiro. Pode ter conseguido a licenciatura de forma errada, mas conseguiu-a, por isso é engenheiro." Pois. Por essa ordem de ideias, nenhum crime deve ser punido. E ficámos todos com a certeza que se o visado não fosse o sr pseudo-engenheiro, mas sim um político de outro partido, que a conversa seria outra.
Sinceramente, não sei como há pessoas que conseguem fazer as viagens de casa até ao local de trabalho, com palas tão grandes a taparem os olhos.

Os parasitas de Portugal

Recebi interessante powerpoint sobre trafulhices das grandes figuras da nação, uma descrição perfeita de como sugam o dinheiro dos contribuintes. As mesmas criaturas que nos desgovernam há décadas... Como devo "educar para a cidadania" vou utilizar os exemplos nas aulas de cidadania e mundo actual. Pelo menos ajudo umas crianças a abrirem os olhos. E os senhores inspectores (uma corja geralmente recrutada na árvores dos velhos presidentes de escola corruptos) bem podem vir assistir se quiserem, desde que tomem banho e tenham maneiras.

momentos alheios ao tempo


"Now I see you standing with brown leaves falling around and snow in your hair. Now you're smiling out the window of that crummy hotel over Washington Square. Our breath comes out, white clouds mingles and hangs in the air. Speaking strictly for me, we both could have died then and there..."

(Joan Baez, diamonds and rust)

Andrew Wyeth, Day dream


it's late (bso apropriada para a hora tardia)

"...
It's late - and I'm bleeding deep inside
It's late - ooh, is it just my sickly pride?
Too late - even now the feeling seems to steal away
So late - though I'm crying I can't help but hear you say
It's late - It's late - It's late
But not too late
..."
(B. May / Queen - News of The World)

Os loucos II

A segunda sala (separada da primeira por uma simples porta de madeira) está reservada para os casos de dependência. É nela que os fumadores se reunem, sentados em redor de mesas que servem de suporte para os cinzeiros. Aspiram o fumo e expiram-no depois de sentirem o seu efeito no corpo e nos sentidos. O governo e as autoridades sanitárias, na sua ânsia de combaterem todos os vícios que não os seus, mais legítimos, da mentira e da pilhagem e do arrogante pretencionismo, já têm estruturadas leis e regulamentos que, por mero pudor, não apelidaram de "solução final", mas que é copiada da original. O seu objectivo é o extermínio completo do vício e a criação da sociedade perfeita (pelo mesmo motivo, foi já proibido o acesso dos pacientes à coca-cola, em nome da sua saúde e da independência cultural da Europa).

Na sala repleta de fumo, os fumadores apresentam olhar triste e os rostos e os corpos cansados. O tabaco dá-lhes forças, brilho no olhar e um sorriso nos lábios. Até a beata morrer esmagada no cinzeiro e a campaínha soar. O fumo liberta também as palavras e, pouco a pouco, também o riso. Por esse motivo, a sala é frequentada vários pacientes que escaparam à prisão do vício, atraídos pelas vozes que lhes poderão acalmar a angústia da solidão que os sufoca. Alguns parecem ter tanto para dizer. Mas entram e sentam-se e ouvem, de olhos baixos e ombros curvados, à espera que algo aconteça. Acabam por se retirar, sem que nada aconteça.

A sala atrai também um curioso grupo de interesseiros, pacientes internados por vários motivos mas que têm em comum uma dificuldade em assumirem a sua condição de viciados. Iludem-se negando-se a comprar tabaco, mas não resistem a pedir continuamente cigarros, dia após dia, com um sorriso já ensaiado. Pelo facto de gostarem de consumir o que hoje se considera um luxo com o dinheiro de terceiros, alguns destes elementos foram diagnosticados como sofrendo de um síndrome designado de "Teixeira dos Santos", nome de um dos casos mais graves e noticiados em vários meios de comunicação.

Também nessa sala, está sentado um homem, um vulto cinzento e curvado, quase sempre silencioso. Entra olhando o chão, na crença de assim a sua presença passar despercebida, procura um lugar vazio e senta-se. Quando fala, o tom de voz é tímido, quase inaudível. Abre uma volumosa pasta de mão, a transbordar de folhas desordenadas, com pontas dobradas e vincadas, cheias de desenhos e garatujos feitos a esferográfica. O seu tema preferido são rostos femininos, de cabelos ondulados, olhos imensos e uma expressão de tristeza que nasce contra a sua vontade. Com a mão, procura uma caneta nos bolsos, estende uma folha na mesa, que alisa com a outra mão, e principia a desenhar. Durante o tempo em que o desenho se vai compondo, entra numa espécie de mundo próprio e o tempo parece passar mais depressa e mais leve.

Junto a ele, uma rapariga segura o cigarro no ar, com o cotovelo apoiado na superfície branca da mesa, de forma a manter o fumo longe de si. A sua fixação não são desenhos, mas números. O seu olhar percorre a sala contando mosaicos e descobrindo padrões, ordenando-os de três em três, de cinco em cinco. Apaga um cigarro e sorri satisfeita. O seu sorriso é bonito e não pertence àquele local. O homem que desenha aprecia-lhe o sorriso. Por esse motivo, quando termina um desenho, ou mesmo a meio, liberta-se um pouco do seu mundo e mostra a folha à rapariga. Invariavelmente ela sorri e ele sabe disso. Olha-a, guarda-lhe o sorriso na memória, na esperança que se prolongue, e continua o desenho ou inicia outro.

Uma outra rapariga entra na sala. Tem o cabelo desenhado em ondas claras e caído, como braços de quem desistiu. O seu rosto é atraente, mas está escurecido por olheiras e as suas palavras são lamentos e prenúncios de fragmentação interior. Fala pouco e sempre mantendo uma distância de desconfiança em relação aos outros, lembrando um animal acossado. A sua fragilidade deixa-a à mercê das agressões dos enfermeiros e, no entanto, lá está dia após dia, no seu lugar, tentando aguentar mais algum tempo.

O barulho que enche a sala é a voz de um dos pacientes, que sofre crises obsessivas. Essas crises podem ser despoletadas por uma simples palavra que alguém diga e que lhe desperte a atenção. Nessa altura, começa a falar sobre o assunto em questão, num discurso interminável que se desenha em espirais que vão preenchendo o tempo e a sala. Não é o pior caso do género. Ataques semelhantes têm sido verificados em dois ou três dos pacientes, tendo um deles balbuciado uma tarde inteira patetices sobre arquitecturas, casas e ruas, lamentando, no final, o tempo de vida gasto em conversas inúteis.

sábado, novembro 17, 2007

Os loucos I

O edifício foi construído para servir de escola. Entretanto, com o ensino caído em desuso graças às maravilhas das novas oportunidades, pensou-se no seu desmantelamento. Porém, um plano de recuperação de edifícios públicos foi posto em prática e o velho edifício (ou melhor, a velha estrutura de edifícios, um conjunto de blocos ligados por linhas de coberturas de zinco ou imitando telhas cinzentas) passou a servir de enfermaria e centro de dia para os loucos e os inadaptados. O ministério do ensino, de forma discreta, enviou para lá todos aqueles seus funcionários em estado de demência. Muitos estão num estado tão avançado que acreditam ainda estar em funções. Jovens e enfermeiros adultos contratados para representarem o papel de alunos e pais ajudam à ilusão, numa política de saúde inovadora. Todas as manhãs, os loucos se dirigem para o edifício, alimentados a café, açúcares e tabaco. Horários são distribuídos pelo enfermeiro-chefe, ou pelas enfermeiras do seu gabinete. Os loucos, esperando o chamamento de sereia das campaínhas, um cântico incómodo, ao mesmo tempo odiado e irresistível, enchem as salas de convívio, a seu tempo intituladas de salas de trabalho. Numa das mesas, um homem grande e vestido de negro, com uma voz forte e incómoda, abre a sua pasta. Todo o conteúdo está alinhado de forma exacta e compartimentada. Sofrendo de um problema de organização compulsiva, o homem é incapaz de lidar com o inesperado. Tornou-se impaciente, irritável. Quem o observa pensa num kappo em Birkenau e violinos amargurados parecem ouvir-se lembrando tempos de morte frio e sofrimento. A pasta fecha-se o observador desperta dessa imagem que o possuiu.
O seu olhar procura outro alvo. Num canto da sala está sentada uma mulher de cabelos ondulados e negros, com um rosto e um corpo que poderiam ser atraentes, mas que acabam por provocar uma estranha repulsa (instintiva, um pressentimento de perigo escondido no olhar vazio e penetrante ou nos gestos que parecem calculados e ensaiados até ao mínimo detalhe). A mulher está isolada e em silêncio. Quando chegou, nos primeiros tempos do seu tratamento, mostrara-se extrovertida e alegre. Essa capa, porém, caiu ou desfez-se e hoje os outros doentes passam por ela como se de uma estátua se tratasse, um corpo inerte depositado num dos sofás de tecido sujo. Mesmo assim, a mulher por vezes fala e a sua voz ergue-se enchendo a sala. O ruído incomoda os outros, que ouvem em silêncio primeiro, depois em burburinhos de pássaros, de asas de insectos ou de águas caindo à distância. Olham-na por momentos, depois desviam o olhar para o chão e deixam-na envolvida no seu discurso.
(continua)

sábado, novembro 10, 2007

retrato de uma conspiração ou do verdadeiro rosto do Estado Português?

"O que Catalina Pestana tem vindo a dizer preto no branco em entrevistas públicas, a que se soma a informação que acrescentou em privado e confidencialmente aos responsáveis do MP e da Casa Pia, é que existe uma acção concertada, para proteger um grupo de poderosos envolvidos em crimes de pedofilia. Aponta o dedo a círculos do PS e da maçonaria. Concretiza as suas acusações reafirmando a sua convicção da culpabilidade de Paulo Pedroso e acusando os socialistas de terem alterado os Códigos para proteger os acusados no processo Casa Pia. Catalina Pestana não faz meias acusações, coloca nomes, circunstâncias e factos suspeitos na sua voz, na primeira pessoa.
A resposta a Catalina por parte dos visados é, para não ir mais longe, frouxa e incomodada. Por um lado, há uma clara tentativa de a desacreditar, por outro, uma ausência de acção que só dá força às suspeitas lançadas. Por exemplo, nomeia directamente Paulo Pedroso, que no passado processou muitos dos seus acusadores e jornalistas que trataram o caso, mas que agora diz ter intenção de não o fazer à sua acusadora actual. Do mesmo modo, continua sem ser esclarecida a história das alterações aos Códigos nos seus artigos mais sensíveis para o caso Casa Pia, sem se perceber o que aconteceu às actas da Comissão e quem introduziu essas alterações. Sabe-se quem diz que não foi responsável, não se sabe quem foi o responsável e parece cada vez mais que há um encobrimento sobre essa alterações.
Não me parece haver loucura especial nas palavras de Catalina Pestana e os que agora a tentam desacreditar foram alguns dos que a escolheram ou a aceitaram para as funções que exerceu. ... O que Catalina Pestana diz, caso seja verdade, conduziria, em qualquer país civilizado, à queda do governo e à incriminação de todos os envolvidos naquilo que é, na verdade, o retrato de uma conspiração."
(JPP, no Abrupto)

..."take a good look around, this is my hometown" (B. Springsteen)


sexta-feira, novembro 09, 2007

Lá se vai um dos argumentos para criticar o MacDonalds

"A equipa de Katherine Flegal, dos Centros para o Controlo e Prevenção das Doenças dos Estados Unidos, lançou a confusão na última edição da revista Journal of the American Medical Association (JAMA), depois de ter analisado décadas de inquéritos sobre saúde e nutrição, à procura de uma associação entre as categorias de índice de massa corporal (IMC) e as várias causas de morte dos norte-americanos. Diz a equipa que, afinal, o excesso de peso não está associado a um aumento da mortalidade devido às principais causas de morte, à excepção da diabetes e doenças renais, para as quais esses valores aumentam ligeiramente. Quem tenha um excesso de peso moderado poderá até morrer menos de alguns cancros do que as pessoas com peso normal, uma conclusão surpreendente. Quer dizer que, depois de tantos anos a ouvirmos falar dos riscos do peso excessivo, até podemos ser ligeiramente gordos que não faz assim tanto mal? Sim, podemos, segundo este estudo, que analisou os dados relativos a milhões de pessoas, coligidos desde os anos 70. De facto, nos cancros não relacionados com a obesidade (pulmões, pele ou linfomas), nas doenças respiratórias, em situação de ferimentos e infecções em geral, as pessoas com excesso de peso (mas sem serem obesas) até parecem estar mais protegidas do que as têm um peso normal. Para as doenças cardíacas, o estudo não encontrou diferenças estatísticas entre as pessoas com peso excessivo e normal. Ter uns quilos a mais, conclui ainda o estudo, nem sequer aumenta muito o risco dos cancros relacionados com a própria dieta, nos quais se incluem o cancro do cólon, da mama, útero, pâncreas, esófago ou rins." (no Público).

A bem da educação

Como complemento a esta posição, proponho que também a função de Encarregado de Educação Responsável seja atribuída apenas a quem fizer um exame de admissão. Porque eu também acho que a qualificação inicial de alguns E.E. não é a melhor e que há um certo facilitismo no acesso ao cargo. Sugiro também que se penalizem os E.E. absentistas e os que vivem naquele estranho limbo que lhes turva o olhar e os faz olhar para os seus petizes como Einsteins e Mozarts em calções e sandálias, crianças extremamente inteligentes, capazes e adultas mas, curiosamente, com um grave problema de personalidade, que as leva a fazer "asneiras" por mera influência de uns malignos colegas.

mensagem 600

Chegado à mensagem 600, que balanço se pode fazer deste blog? Quem o lê, afinal? Era interessante saber... Ou tudo o que aqui tem sido colocado pouco mais tem sido do que excertos de monólogos que vamos fazendo em frente ao monitor?
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Um destes dias, pedi a um aluno do curso de informática para desenhar uma palavra que escrevi num papel. A palavra era "monitor". Ele olhou para mim e perguntou o que era. Como tinha escrito a palavra em letra de imprensa, excluí imediatamente a hipótese de ele não estar a perceber a letra. Como mais ninguém na sala podia saber qual era a palavra, murmurei sinónimos de "monitor" e descrições o mais exactas possíveis, com um pouco de mímica incluída. Ele finalmente olhou para mim com um certo brilho nos olhos, que interpretei como o olhar de quem finalmente viu a luz e percebeu o que eu estava a explicar. Confiante, afastei-me e disse-lhe: "desenha". E ele desenhou. O "monitor" estava a parecer-me demasiado rectangular. Demasiado. Mas o rapaz até desenhou bem, porque todos os colegas foram capazes de identificar o objecto representado no quadro: a orgulhosa e vertical torre de um pc. Já tinha referido que este aluno está a tirar um curso de informática? Pois...

A bit of theology


Math is the language God used to write the universe...

O homem deve ter tido um prof de Matemática muito austero

"The good Christian should beware of mathematicians and all those who make empty prophecies. The danger already exists that mathematicians have made a covenant with the devil to darken the spirit and confine man in the bonds of Hell."
(St. Agostinho)

quinta-feira, novembro 08, 2007

Joan Baez - Diamonds and Rust


Well I'll be damned
Here comes your ghost again
But that's not unusual
It's just that the moon is full
And you happened to call
And here I sit
Hand on the telephone
Hearing a voice I'd known
A couple of light years ago
Heading straight for a fall
As I remember your eyes
Were bluer than robin's eggs
My poetry was lousy you said
Where are you calling from?
A booth in the midwest

Ten years ago
I bought you some cufflinks
You brought me something
We both know what memories can bring
They bring diamonds and rust

Well you burst on the scene
Already a legend
The unwashed phenomenon
The original vagabond
You strayed into my arms
And there you stayed
Temporarily lost at sea
The Madonna was yours for free
Yes the girl on the half-shell
Would keep you unharmed
Now I see you standing
With brown leaves falling around
And snow in your hair
Now you're smiling out the window
Of that crummy hotel
Over Washington Square
Our breath comes out white clouds
Mingles and hangs in the air
Speaking strictly for me
We both could have died then and there

Now you're telling me
You're not nostalgic
Then give me another word for it
You who are so good with words
And at keeping things vague
Because I need some of that vagueness now
It's all come back too clearly
Yes I loved you dearly
And if you're offering me diamonds and rust
I've already paid

quarta-feira, novembro 07, 2007

Jornalismo de qualidade - exemplo do público

Nesta "notícia" (parece mais um artigo de opinião), o jornalista fala de Santana Lopes como o "menino guerreiro" (lembrando a música da última campanha de Santana). Se essa designação se aceita num texto de opinião de crítica, é inadmissível numa notícia, por revelar um preconceito do seu autor. Por que motivo sócrates não é apelidado de gladiador já que a banda sonora do Gladiator, de Zimmer, é utilizada em muitos actos de propaganda socrática?
Assim se procura minimizar a imagem de um político e manter a imagem de outro (através de utilização de designações pomposas e oficiais). É o jornalismo que temos.
Já estou a imaginar a cara de parvo de um certo "engenheiro" perante esta notícia.

AAC homenageia sócrates

Pelo menos é o que parece. Com as alterações ao código da praxe, que incluem o aparecimento de novos títulos como bolognez (no comments) ou marquez (homenagem justificadíssima ao sr Sebastião José de Carvalho e Mello), o cortejo da Queima das Fitas, tradicionalmente realizado a uma Terça-feira, vai passar para um domingo, dia da semana em que josé sócrates se "licenciou" na defunta Independente.

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ps: Depois do trabalho feito com o primeiro-analfabeto, inaugurando a primeira licenciatura EFA portuguesa, não restava realmente outra solução à Independente a não ser fechar as portas.

terça-feira, novembro 06, 2007

Só somos apenas lideres da Liga e da Champions

É lamentável ver a figurinha triste que o Benfica e o Sporting fazem. O FCP está num nível muito superior. Nem podemos fazer comparações pois não fazem sentido. Tenho pena que o futebol português se resume ao meu clube. Na Europa é o que se vê, só o FCP é que demonstra ser uma equipa de topo europeu e no campeonato não temos concorrência à altura. Enfim...ao menos podemos assistir a momentos fantásticos como o golo do Tarik contra o Marselha, por exemplo. Um hino ao futebol....

domingo, novembro 04, 2007

A não perder

O novo album de Katie Melua. Ainda só o ouvi duas ou três vezes, mas já dá para perceber que mantém o nível de qualidade dos anteriores. A amargura do segundo album (Piece by piece) aparece agora um pouco mais mitigada. Continua presente nas palavras que continuam a expressar lamentos, angústias e desilusões, mas há mais alegria e mais esperança no ritmo e no espírito que envolve as letras. E termina com chave de ouro (como se costuma dizer), com uma versão de In my secret life, de Leonard Cohen, pelo que definitivamente não se deve perder.

sexta-feira, novembro 02, 2007

Jornalismo de qualidade - exemplo de A Bola

Eis a notícia publicada na edição online desse grande matutino de referência, A Bola:

"Domingos apela ao apoio dos adeptos

O técnico do Leiria pede para que os adeptos marquem presença no estádio e ajudem a equipa a suplantar este período menos positivo que atravessam.

«Nós gostamos de jogar com público. É importante para os jogadores sentir o forte apoio dos adeptos», realça Domingos, que apenas pensa num resultado frente à Académica: «o objectivo para domingo é ganhar, em casa, porque uma vitória pode trazer não só mais pontos mas também mais confiança aos jogadores.»"
O jornalista que escreveu esta "notícia" ou anda muito distraído ou é muito mau. Desde logo porque o mister Domingos Paciência não é treinador da União de Leiria, mas sim da Académica de Coimbra. Mas mesmo que o jornalista fosse desconhecedor desse facto, bastava olhar para a jornada da liga portuguesa para perceber que algo estaria mal no texto que ia publicar. É que a Académica nem sequer joga com a União neste fim-de-semana, mas sim com o Nacional da Madeira (a briosa recebe o Estrela). Mas mesmo que desconhecesse também esse facto, qualquer pessoa que tenha um interesse (mesmo que mínimo, ínfimo, minúsculo) pelo mundo do futebol sabe que o Domingos nunca poderia apelar ao apoio dos adeptos da União, pelo simples facto de que a União de Leiria não tem adeptos.
Amadores...

sábado, outubro 27, 2007

os iluminados

O mal das generalizações é que tendem a ser injustas. Diz-se que os políticos são todos iguais, que são todos mentirosos. Que prometem e, depois de eleitos, não cumprem. Pois bem, tendo em conta as mudanças de 'opinião' do falecido Cavaco, do primeiro-analfabeto Sócrates e do PSD em relação ao referendo, começa a ser difícil não pensar que são realmente todos iguais.
Sócrates e o PS, verdade seja dita, já tinham demonstrado o seu respeito pelo peso dos referendos quando repetiram o do aborto até obterem o resultado que lhes interessava. É a chamada democracia socialista (certamente uma herança dos 'bons tempos' da primeira república (que deu no que deu), há liberdade de expressão e de opinião desde que seja a nossa e não outra contrária à nossa.


No meio disto tudo, surge uma personagem cada vez mais hilariante, chamada Vital Moreira. Esta mente iluminada considera que os portugueses não se devem pronunciar sobre o referendo porque são ignorantes e não iriam perceber o tratado, mesmo que o lessem. Já Manuel António Pina questionou, no DN, se os deputados que , na opinião de V. Moreira, o devem aprovar serão menos ignorantes e dar-se-ão efectivamente ao trabalho de o ler. E compreender. Obviamente que não (lá estão as generalizações maldosas, mas se V. Moreira as pode fazer, quem não pode?).


A opinião de V. Moreira levanta até outra questão, pois parece ser um bom (salvo seja) começo para defender o regresso do voto censitário ou do despotismo esclarecido, em que sócrates, licenciado num domingo, e V. Moreira (atrevo-me a acrescentar ainda o dr. Júdice e o actual sósia do prof. Cavaco) seriam as mentes esclarecidas que decidiriam por nós (arrepios de terror). Se os Portugueses não se podem pronunciar em relação ao que não podem compreender, então por que motivo votam para eleger deputados e presidentes?


Dando mostras de grande bom senso, V. Moreira sugeriu ainda (vejam a luz, vejam a luz) que, a haver referendo, a pergunta deveria ser:
"concorda com a permanência de Portugal na U.E?"
(ou algo do género, não memorizei o texto, perdoem a minha ignorância).
E realmente devo ser mesmo ignorante, pois olho para essa pergunta e, coisa estranha, não me parece o mesmo que perguntar:
"concorda com a ratificação do tratado de Lisboa?"
E penso que para muitos Portugueses a confusão será idêntica, pois à primeira responderiam Sim e à segunda responderiam Não. Lá está a nossa ignorância, somos capazes de à mesma questão (sim, porque se V. Moreira sugere que é a mesma coisa, então é porque é) responder sim e não. Por favor, senhores iluminados, votem por nós, opinem por nós, não permitam o referendo.


(sócrates com o seu diploma - saindo da parede, o exame de inglês técnico)

V. Moreira em traje de gala
(pose de deputado português após leitura e compreensão integral do Tratado de Lisboa, lamentando a ignorância do povo que o elegeu e consciente da importância dos cursos EFA para a compreensão futura dos tratados europeus por parte dos súbditos da nação - um olhar entre o orgulhoso e o doloroso)
ps: Ah, mas agora entendo uma coisa: aquela questão das promessas que não são cumpridas, as mentiras do pseudo-engenheiro (scuts, baixa de impostos, progresso económico, combate ao desemprego, justiça social, não à ditadura do défice, sim sou mesmo licenciado, aposta na educação e etc...) não foram realmente mentiras nem situações confusas, nós é que, na nossa pobre e vil situação de ignorantes, não percebemos as sábias e luminosas palavras do mestre. Tal como não temos entendido nenhum político nas últimas décadas.

quinta-feira, outubro 25, 2007

alunos que frequentam escolas públicas I

M. tinha treze anos e estava no 7º ano da escola básica de uma pequena povoação do interior transmontano. Tinha olhos e cabelos escuros, que trazia geralmente emaranhado e espigado. Sorria quando nos via e era uma rapariga carinhosa e calada. Estudava na escola, sempre que o horário permitia. Quando tinha uma hora livre ou depois de almoço. Sozinha nos bancos que ladeavam o polivalente barulhento, com as grandes janelas de vidro atrás de si deixando entrar a luz branca do inverno. Outras vezes era vista na biblioteca da escola, um espaço com menos livros que algumas estantes particulares (conheço algumas) e alguns computadores velhos, pedindo ajuda a algum professor para esclarecer dúvidas. As notas, no entanto, dificilmente eram positivas. A sua caminhada até ao 7º ano fora complicada e deixou marcas. Beneficiando (digamos assim) de uma lei que quase proíbe as retenções e de uma perspectiva caridosa de muitos conselhos de turma foi passando sem conseguir aprender muito. Não tinha grande vontade de aprender, o esforço que fazia era apenas ditado pela obrigação e por uma necessidade de fazer algo bem feito, que lhe aumentasse a auto-estima e o seu valor aos olhos dos outros. O seu grande problema estava em casa. Em casa não havia livros, mas não era esse o problema. Em casa havia um pai alcoólico e violento (nem sempre andam lado a lado estas características, encontram-se muitas vezes isoladas, mas desta vez ali estavam, como duas amigas de longa data). E sempre que M. precisava de estudar à noite, tinha de rezar (não encontro melhor palavra) para que o pai não chegasse zangado, nem embriagado, nem violento. Porque quando isso acontecia (e parece que as rezas dela não chegavam muitas vezes aos ouvidos de quem devia), e o homem entrava em casa e a via de luz acesa agarrada a um qualquer livro ou caderno, não sei se gritava (mas devia gritar), não sei se batia (ela não disse se batia ou não), mas sei que não tinha meias medidas e desligava o quadro da electricidade, afogando a casa em escuridão. Depois deitava-se e, passado algum tempo (quantos minutos? quantas horas depois?), adormecia. E só então M., mais silenciosa do que um ratinho, se levantava e continuava o seu esforço inglório à luz da vela. Nesse ano, M. ficou retida. Não sei se justamente ou não. A verdade é que as suas notas eram más. Falo de resultados, claro. Falo, digamos assim, de 'rankings'. Mas também é verdade que as suas notas não poderiam ser melhores. E duvido que muitos dos que passaram com boas notas nesse ano nos confortáveis e reservados colégios da elite conseguissem melhores resultados nas mesmas condições.
Dois anos depois, quando voltei à escola, M. estava no 8º ano. E continuava a sorrir como antes.
Obviamente, M. nunca chegou ao 12º ano. Perdi-lhe o rasto entretanto. Presumo que terá terminado o 9º ano (provavelmente à custa de um qualquer CEF, para não ter de enfrentar os exames de português e de matemática que provavelmente a obrigariam a repetir o 9º ano). Ou então desistiu antes disso e procurou trabalho para sair de casa.

o ranking das escolas

Hilariante o relevo dado pelos meios de comunicação ao 'ranking das escolas'. Um jornalista que pensasse um pouco no que está a fazer e tivesse conhecimento dos assuntos de educação certamente olharia para os dados apresentados de forma correcta, e não como o ministério da educação (e outros grupos de interesses) querem que se olhe. Na leitura oficial, há o bom ensino, que é privado, e o mau ensino, que é público. Como grande parte da opinião pública desconhece o que realmente se passa nas escolas, tirando o que se limita a ver noticiários e a ouvir dos relatos dos filhos, é natural que adopte essa leitura oficial de forma acrítica e a tome por verdadeira. Mas observem só como foi feito o 'ranking'. O dado valorizado nessa hierarquização de estabelecimentos de ensino foi o da 'classificação média por exame'. Ou seja, somaram-se as notas obtidas em exame no ano lectivo passado por todos os alunos de cada escola e dividiu-se o valor pelo número de alunos. Só isso está em causa. E, com este estudo profundo, eis a conclusão a que se chegou:
- As melhores escolas são colégios privados, pois nas 10 primeiras só está uma escola pública, a Escola Infanta D. Maria (Coimbra).
Porém, na edição desta Quarta-feira do JN (não procurei o link porque não tive tempo), vem uma tabela que, para além do nome da escola e da média obtida, tem mais duas informações essenciais, mas que a comunicação social se esqueceu de analisar. A localização geográfica dessas escolas e o número de alunos que fizeram exames nas escolas privadas que estão no topo.
Pois bem, ninguém acha estranho que as melhores 25 escolas do país se localizem todas em Lisboa, Coimbra e Porto (com cinco excepções, 2 de Gaia, 1 de Cascais e outra de Loulé - interessantes excepções, aliás)? Não há alunos inteligentes na Guarda, em Murça, em Famalicão, em Évora, em Braga, em Chaves, em Carrazedo de Montenegro, na Maia, em Pombal, em Leiria? Ou não há aí professores competentes? A resposta para ambas as questões é só uma: há (conheço pessoalmente exemplos quer de alunos quer de professores).
Nesse caso, não valeria a pena tentar aprofundar as causas dessa geografia do sucesso escolar em Portugal? Não estará também ligado a um maior contacto com as ofertas culturais (desde cinemas, museus, concertos, livrarias, centros comerciais...), ao maior poder de compra da população, ao nível socio-económico e cultural dos agregados familiares, a um estímulo e exigência maiores por parte dos pais ou do grupo de amigos em que os alunos se integram para se lutar por um diploma (nem todos o podem tirar ao domingo)? Está, mas não interessa porque contraria a conclusão oficial, aquela que é feita de branco e preto, a que opõe o bom ao mau ensino.
Olhemos agora para o número de alunos que fez exames nos colégios no topo do ranking. Nos 3 primeiros, o número de alunos é de 48+32+15. Até o eng. Guterres era capaz de fazer esta conta: 95 exames. Mesmo que a cada exame corresponda um aluno, isso daria, no máximo, a 95 alunos divididos por três colégios. Este ano, eu tenho mais alunos do que esses. Pois bem, na primeira escola pública, o número de exames foi de 553. Não admira, pois, que tenha tido uma média inferior aos 3 primeiros.
Não sei o que se passa nesses colégios em particular, mas sei o que se passa em vários. Era uma vez um colégio que era o melhor no ranking do ensino de uma certa disciplina. Porquê? Porque obtivera uma média de 19 vírgula qualquer coisa nos exames desse ano. Fantástico, não é? E quantos alunos fizeram exame nesse colégio? Pois bem, um, aquele que eles sabiam que iria ter bons resultados. E os outros? Foram 'convidados' a fazer o exame na escola pública mais próxima.
Sabemos, também, que os alunos dos colégios não são, em regra, iguais aos alunos da maioria das escolas públicas. Os pais são diferentes, as terras onde vivem são diferentes, o ambiente que têm em casa é diferente. E os colégios não são obrigados a cumprir uma coisa muito gira chamada escola inclusiva, que exige que nenhum aluno seja excluído de um estabelecimento de ensino público. Os alunos com dificuldades de integração, de adaptação, com deficiências ligeiras, com ambientes e passados caóticos, em geral, não frequentam colégios. Por isso a comparação que é feita apenas a nível dos resultados obtidos nos exames é obscena, é absurda.

segunda-feira, outubro 15, 2007

Uma questão de trocos...

O inglês Robbie Fowler promete chegar à reforma em grande estilo. O avançado, que ainda é o quarto maior goleador da história da liga inglesa, actua actualmente no Cardiff, do País de Gales, que disputa a segunda divisão.
O problema é que Fowler é natural de Liverpool, onde jogou durante dez anos se tornou um ídolo dos adeptos do clube com o mesmo nome. Nasceu e cresceu lá, gosta muito da cidade e não se quer ver em outro lado nem por nada deste mundo.
Ora como de Liverpool a Cardiff ainda vão 217 kms, o avançado achou que só mesmo a voar é que lá chegava a tempo dos treinos. Vai daí... comprou um helicóptero. Custou 320 mil euros, mas isso também não pareceu o problema.
Até porque essa não foi a única despesa. Para poder utilizar o helicóptero, construiu ao lado de casa um heliporto que lhe custou cerca de 7800 euros. Para se deslocar todos os dias ainda contratou um piloto pessoal, que lhe custa 315 euros por dia.
Feitas as contas, a brincadeira fica cara. Mas é mais rápida. Fowler coloca-se de Liverpool no campo de treinos do Cardiff em hora e meia. Para regressar a casa é mais hora e meia. Diga-se, de resto, que Fowler tem contrato com o clube galês até ao final da época 2008/09.

sexta-feira, outubro 12, 2007

prémios de treta

Al Gore vence prémio nobel da paz por ser locutor de um documentário. Sinceramente, penso que estaria melhor entregue ao Eládio Clímaco, que tem um trabalho de maior qualidade nesse campo (admirável o seu trabalho na Epopeia dos Bacalhaus.
Quanto ao documentário Uma verdade inconveniente, há aparentemente uma palavra errada no título, e essa palavra é Verdade:
O Deco foi o mesmo jogador que disse que o Ronaldinho foi o melhor jogador que já jogou no Barcelona, o que mostra o pouco que percebe de futebol (escuso de voltar a dar os exemplos de jogadores bem melhores que usaram a camisa blaugrana). Portanto, o que ele diz não merece grande crédito.

Quanto ao Raúl, o melhor marcador da Liga dos Campeões, vencedor de 3 Champions e melhor marcador da competição e da Liga vários anos, precisa tanto desse prémio como o Lobo Antunes precisa do Nobel (ou nobél como diz o espanholeco de Lazarote).

quarta-feira, outubro 10, 2007

Concordo com o mágico Deco

Nem Kaká, nem... Cristiano Ronaldo. Deco entregava a Bola de Ouro a Messi. O médio garantiu esta terça-feira, em entrevista à Rádio Catalunha, que o colega argentino é o maior candidato ao prémio que distingue o melhor jogador a actuar na Europa.
«Pelo que tem feito e pela qualidade que possui, Messi merece a Bola de Ouro», disse o internacional português. «Encanta-me como jogador. Não sei se ganhará o prémio, porque Kaká também teve um grande ano, mas eu gosto mais de Messi».
Mas se a escolha é difícil, para mim, nao deixam de ser os 3 melhores jogadores do Mundo.
P.S. Porque será que o Raul não está na lista hehe :)?

segunda-feira, outubro 08, 2007

Memórias de uma Gueixa



Há cerca de dois anos que as "Memórias de uma Gueixa" está na pilha de livros a ler, na mesa ao lado da cama. Por diversas razões fui adiando. Foi a S. que me emprestou e tinha recomendado. Mas ela é supeita pois as histórias com o Oriente como pano de fundo são muito do seu agrado. No meu último aniversário também o recebi de presente. Quem mo ofereceu trouxe o talão para troca pois considerava quase impossível que eu já não o tivesse, mas como não sabia bem o que escolher...

Finalmente peguei nele. E logo na primeira página fiquei seduzida. Ainda tenho alguma dificuldade em compreender como é que pode ser o primeiro livro deste autor. Que tenha levado dez anos a escrevê-lo não estranho, mas conseguir fazê-lo desta maneira, como primeiro romance, acho surpreendente.

O mundo das Gueixas numa versão encantatória e simultâneamente com glamour violento.

O filme é igualmente bom, com uma fotografia fabulosa. Recomendo ambos.

diálogo

Ela estava à espera, alegre e animada, aguardando cortesmente para começar a sopa, quando Mr. Welton tomou o seu lugar à mesa.
«Oh, sopa de tomate, he?» disse ele.
«Sim», respondeu ela. «Tu gostas, não?»
«Quem - eu?» disse ele. «Ah, sim. Sim, é verdade.»
Ela sorriu-lhe.
«Sim, bem me parecia que gostavas», disse ela.
«Tu também gostas, não é?», perguntou ele.
«Ah, sim», assegurou-lhe ela. «Sim, gosto mesmo muito. Gosto extraordinariamente de sopa de tomate.»
«Sim», disse ele, «não há nada melhor do que sopa de tomate numa noite fria.»
Ela inclinou a cabeça, concordando.
«Também acho que é bom», confessou.
Tinham tido sopa de tomate para o jantar provavelmente três vezes por mês durante a sua vida de casados.
A sopa estava terminada e Delia trouxe a carne.
«Bem, isto está com óptimo aspecto», disse Mr. Welton, trinchando-a. «Já não tínhamos bife há muito tempo.»
«Ora, sim, temos tido, também, Ern», disse a mulher ansiosamente. «Tivemos bife - deixa-me ver, em que noite é que os Baileys cá estiveram? - tivemos quarta-feira à noite - não, quinta à noite. Não te lembras?»
«Tivemos?», perguntou ele. «Sim, acho que tens razão. Parecia-me mais tempo, não sei porquê.»
Mrs Weldon sorriu educadamente. Não conseguia pensar em nenhum modo de prolongar a discussão.
De que é que falavam as pessoas casadas, afinal, quando estavam as duas sozinhas? Tinha visto casais - não daqueles duvidosos, mas pessoas que ela realmente sabia serem maridos e mulheres - no teatro ou em comboios, falando um com o outro tão animadamente como se fossem apenas conhecidos. Observara-os sempre, maravilhada, interrogando-se o que diabo encontravam para dizer.»

Dorothy Parker, Que Pena, in "Contos", Lisboa, Relógio d' Água (pp. 59-60)

sábado, outubro 06, 2007

A Independência de Portugal

Eis o que verdadeiramente deveria ser comemorado a cada 5 de Outubro, pois foi precisamente nesse dia, no já muito distante e quase esquecido ano de 1143, que D. Afonso Henriques e Afonso VII (reunidos em Zamora com a mediação do enviado de Inocêncio II, o cardeal Guido de Vico) chegaram a um acordo de paz que colocou definitivamente a coroa na cabeça de Afonso Henriques e fez nascer o reino de Portugal. O Papa, anos mais tarde, limitar-se-ia a confirmar esse nascimento, recolhendo o reino português na protecção do seu regaço.
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Portugal é dos poucos países europeus que tem uma data de fundação. E curiosamente, é dos poucos países que não acha necessário comemorar a sua independência. Isto apesar de comemorar a restauração dessa mesma independência (1-12-1640). Prefere comemorar datas mais negativas e cujo benefício claro não se percebe. O 5 de Outubro de 1910 é um deles. Fez nascer um regime despótico, sem liberdades políticas, e que muito contribuiu para a ruína económica e financeira e para o caos político que originou o 28 de Maio de 1926. E depois, temos o famoso e over rated 25 de Abril, do qual nem vale a pena falar. O resultado está à vista, e pouco difere do resultado final do 5 de Outubro.