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quarta-feira, janeiro 03, 2007

Lewis Carroll

O autor do Alice in Wonderland, Lewis Carroll (pseudónimo de Lutwidge Dodgson) ficou também conhecido pela sua faceta de fotógrafo. Um pouco menos pela sua faceta de escritor de cartas. Os seus modelos preferidos eram meninas e era também com elas que Carroll se correspondia. É comum dizer-se que a obra é sempre produto do tempo do seu criador. Com Carroll isso é ainda mais verdade. Porque Carroll viveu nos primeiros tempos da fotografia, mas sobretudo porque no período vitoriano não havia ainda a carga que hoje tem tudo o que rodeia a imagem de crianças. Depois dos escândalos belga ou português, depois das notícias de abusos de elementos da ONU, depois do politicamente correcto gerado nos EUA e que (como tudo o que é mau) rapidamente se importou para a Europa, retratar meninas é automaticamente considerado estranho, ou mesmo perverso. O século XX foi, em grande medida, o século do sexo, com as teorias freudianas e o desenvolvimento das várias escolas psicológicas e psicanalistas, a gradual diminuição da censura e (aspecto fundamental) com a explosão do marketing e da publicidade. Acutalmente tudo tem uma conotação sexual, pelo que se Carroll vivesse hoje estaria condenado a dirigir a sua inspiração para outro público e o seu olhar para outros temas. Provavelmente não faria as fotografias que fez na época. Como as fotografias foram tiradas com consentimento das famílias, tal comportamento permissivo provavelmente levá-las-ia também ao banco dos réus implicando a perda da custódia das crianças. O facto de, já adultas, as meninas retratadas manterem uma relação de amizade com o escritor/fotógrafo (em especial a verdadeira Alice, para quem a obra principal de Carroll foi escrita), seria imediatamente analisado sob o olhar da doença e da dependência. Nabokov, para citar apenas um exemplo, não hesita em classificar Carroll como pedófilo, esquecendo que no século XIX as imagens de crianças (incluindo os nús) eram vistas como representações da pureza ( período vitoriano foi, segundo vários historiadores deste período, marcado por uma adoração das crianças). Hoje seria impossível essa leitura, porque o nosso olhar está automaticamente marcado pela mentalidade que nos rodeia. Os nossos medos, as nossas obsessões, tudo nos condiciona e nos impede de ver Carroll como ele provavelmente foi. Mas, para defesa de Lewis Carroll, melhor do que as minhas palavras, leiam o prefácio de Miguel Esteves Cardoso do livro de fotografias de Carroll, obviamente intitulado Meninas.

1 comentário:

Anónimo disse...

De facto, os tempos são outros.Mas há que convir que em algumas situações o que se verifica é o politicamente correcto levado a extremos.