O professor generalista é a última visão do ministério da educação. A partilha do êxtase ministerial coube, desta vez, ao secretário Valter Lemos. A ideia é a de criar um professor único para o 2º ciclo (5º e 6º anos) que deverá dar todas as disciplinas da turma. O mesmo professor dará português, história e geografia de Portugal, inglês, matemática, ciências da natureza, educação visual e tecnológica, educação física e as idiotices estudo acompanhado, formação cívica e área de projecto. Interessante proposta. Numa época de especializações cada vez mais profundas, quando o conhecimento profundo de uma área implica anos mais longos de estudo, o ministério propõe que o ensino fundamental, que é o dos primeiros anos de escolaridade, passe a ser dado por um professor que é formado a "ciências" da educação. Será, mais ou menos, como ter ter um tipo formado em História das Religiões a fazer cerimónias na igreja/mesquita/sinagoga. Ou ter um tipo que fez mestrado em "teoria de ética médica" a fazer consultas de pediatria/ginecologia/estomatologia/oftalmologia. Ou ter um engenheiro ambiental a fazer projectos de novas pontes e edifícios públicos ou programação de um novo sistema informático, uma vez que todos os engenheiros são engenheiros, não importa a especialização (vendo bem, deve ter sido isto que tem vindo a acontecer no governo, tendo em conta os resultados de alguns concursos feitos pela via informática).
O objectivo é óbvio, o de poupar no salário de mais uns docentes. Mas vejamos os "argumentos" do secretário de estado para propor algo tão ridículo. Diz a criatura que se os resultados são maus, é porque a culpa é da falta de formação dos professores. Pois, e é por isso que sugere professores ainda menos qualificados? Hum... Afinal, o professor qualificado não é o que se especializou no assunto que vai leccionar. Pelos vistos, é mais importante ter aquele ridículo mestrado numa coisa que nem sequer é uma verdadeira ciência, mas sim uma filosofia (já que se baseia em pré-conceitos não demonstráveis, como a da inocência e inimputabilidade natural das crianças, entre outros). Aliás, se a pedagogia fosse tão importante, como explicar que o ensino seja pior precisamente quando é ministrado pelos docentes que tiveram 50% do seu curso ocupado com cadeiras ditas pedagógicas, ficando de lado as científicas? E não adianta vir com a história de que vão remodelar os cursos das escolas superiores de educação. Recordemos que estamos a entrar no processo de Bolonha. Se antes era difícil especializar alguém numa só área em 4 anos, agora querem fazer especialistas generalistas (passe o absurdo) em 3? Ou vão clonar o Umberto Eco para formar novos professores?
O segundo argumento é delicioso. Desde logo porque, tal como o anterior, só existe na cabeça da personagem que o defendeu. Diz ele que a passagem do 1º ciclo (1º ao 4º ano) para o 2º ciclo causa "traumas" nas crianças porque não estão habituadas a trabalhar com mais do que um professor. O sr Vitor Lemos deveria conhecer um pouco melhor a realidade que secretaria. É que os alunos do 1º ao 4º ano têm mais do que um professor por ano. Já não falo dos casos em que mudam de professor a meio do ano. Falo dos outros docentes que dão inglês, expressões plásticas, educação física, música, consoante a oferta do agrupamento... Ou seja, cada aluno desses anos trabalha com mais do que um professor, por vezes com 3 ou quatro. Não vejo, por mais essa razão, onde possa estar o trauma. Em relação ao 5º e 6º ano, também é falso (como diziam os ridículos noticiários que sobre isso se debruçaram sem qualquer investigação anterior) que os alunos tenham 8 ou 10 professores diferentes. Se tivessem, sinceramente não percebo o problema. Mas não têm. É que, regra geral, o prof de Português é também o de História e Geografia de Portugal, assim como o de Matemática dá também Ciências da Natureza. Para além disso, ainda são, por norma, os professores designados para estudo acompanhado e área de projecto. Quanto a formação cívica, é sempre dada pelo director de turma que, como é óbvio, tem a seu cargo uma disciplina. Assim, quando muito, os alunos terão entre 5 a sete professores diferentes, apenas mais três ou quatro do que tinham nos anos anteriores.
Outra coisa que o secretário de estado não explica é o motivo que o leva a querer adaptar todo o percurso escolar ao 1º ciclo e não o contrário. Concretizando, porquê aplicar ao 2º (e quem sabe, mais tarde, ao 3º ciclo) o modelo de prof único e não aplicar ao 1º ciclo o modelo de vários professores (que já está, em parte, a ser aplicado)? A razão é óbvia, implicaria mais gastos. Não importa se os resultados são melhores ou piores...
Como estamos perante uma péssima ideia, que nada de positivo irá trazer à qualidade de ensino, quem, então, poderá beneficiar dela? As universidades que têm os mestrados nas áreas das ciências da educação devem estar eufóricas. Só assim conseguem os alunos para os seus cursos pseudo-científicos. Mas, como disse de início, creio que os principais motivos para esta decisão são os da poupança. Ter 1 prof para todas as disciplinas do 5º ano e do 6ºano implicaria, para dar o exemplo da parvónia onde estive o ano passado, que a escola teria apenas 4 professores para esses anos (era o número de turmas) e não o dobro ou o triplo. Com um pouco de sorte, colocam as professoras do 1º ciclo com as turmas do 2º e se poupa mais uns trocados.
É este o exemplo de exigência, rigor e honestidade do nosso governo.
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