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domingo, abril 30, 2006

Era uma vez...

Obrigado, obrigado!!! Temos é de comemorar isto assim que surgir a ocasião!
Epa, pensei que o Raúl dissesse tudo... Foi assim que me senti quando saí de lá. Mas eu conto a história, pelo menos os pormenores que consigo recordar. Creio que deixei passar metade do que acontecia...
Tudo começou há três anos atrás... Bem, para dizer a verdade, há seis anos atrás... Mas vocês não querem que eu recue tanto. Recuemos só umas semanas, então. Um telefonema do orientador anunciou-me a data da defesa. E despertou uma angústia que me inundou o pensamento e o próprio corpo. Mais cansado, mais nervoso. A respiração perturbada, o coração a querer sair. Algum tempo depois, chegou a carta da universidade a anunciar a data. Vá lá, desta vez chegou antes do dia marcado. Os primeiros tempos foram de pânico, sem saber bem o que fazer. Envio um email ao meu orientador. Ao contrário do que é habitual, a resposta demorou mais do que um dia, o que me deixou preocupado. Mas eis que chega o email, com preciosas instruções. Saber justificar as escolhas e as ideias defendidas, ter em atenção possíveis pontos polémicos. E a parte divertida, falar alto e com convicção. Isto é como ser treinador do Pauleta e dizer-lhe remata na direcção da baliza e marca golo. Ou um editor a pedir ao Saramago, vá lá, desta vez usa pontuação e escreve uma história de interesse que tenhas sido realmente tu a imaginar. Eu? Mas como? Se até as crianças se queixam porque falo baixo (aproveito para dizer lhes que se não me ouvem é porque estão a fazer muito barulho, é claro)! Com estas instruções começo verdadeiramente a preparar-me. Leituras e releituras. Mas de novo o pânico. Nessa altura o meu sonho era ser o Sherlock Holmes, devem lembrar-se. Só não me virei para o ópio ou para o cachimbo porque não calhou. Valeu o telefonema do Gabriel (obrigado!!!) para me colocar de novo no caminho correcto. Treinei discursos sempre que podia. Resumi os resumos, sublinhei, reescrevi. Falei com o orientador. Tudo ok. O pânico desapareceu. Para regressar na antevéspera. Um jogo de futebol deixou-me suficientemente cansado para conseguir adormecer, mas nessa noite sonhei com a defesa. O arguente, no entanto, era uma senhora (discípulos de Freud, façam as vossas leituras). E a coisa não corria muito bem (do pouco que me lembro, sei que se repetiu pelo menos duas vezes, o que não é bom). Para piorar, um dia antes o meu pai tinha sido internado para exames (tudo ok, felizmente - saiu poucas horas antes da defesa, bom sinal, bom sinal).
Vésperas.
Na véspera, as palavras que mais vezes ouvi nesse dia foi "boa sorte" "vai com calma" "vai correr bem" e "quem te mandou meter nisto". Um último telefonema de alguém que também passou pelo tormento. Apesar disso, durmo mal. Tento reler alguma coisa, mas nem me consigo concentrar. Desisto e tento esquecer um pouco, vendo o Gene Kelly a dançar com a Cyd Charisse no Brigadoon. O filme fala de uma aldeia mágica na Escócia para onde um homem foge da agitação da sua vida para encontrar o amor da sua vida. Hum, tentador.
O dia.
Chego à FLUC às 12h. Tinha combinado às 13h para almoçar com o João. Sento-me, de mp3 a abafar o mundo, com as folhas à frente. Nem reparo no que está escrito. O tempo está a passar depressa. Olho para o relógio, 14h. Volto a olhar, 14h15. Depois 14h35. 14h40. 14h50. Entramos na Gama Barros, a sala onde tive todas as aulas do mestrado. Uma das paredes tem grandes janelas, as restantes estão cobertas de livros do chão ao tecto. No centro está a grande mesa rectangular, de madeira castanha, escura e pesada. Na cabeceira estão três cadeiras e em cada uma um elemento do juri. À esquerda o meu orientador, no centro a directora do mestrado e à direita o arguente. Eu sento-me de costas para a porta, com as janelas à minha frente e o juri à minha esquerda. No fundo da sala, para lá do fim da mesa, está o público sentado em cadeiras desconfortáveis. Rodo um pouco a cadeira na direcção do juri e o público rapidamente desaparece. Estão lá colegas do mestrado, amigos e um ex-aluno, agora aluno do curso de História (quero acreditar que a culpa não é minha). Às 3h começa. Feitas as apresentações, o arguente começa a falar. As primeiras palavras são simpáticas e dão confiança. Gostou do trabalho. Só fiquei momentaneamente preocupado porque parecia que tinha gostado sobretudo do apêndice documental. Mas compreendi o ponto de vista. Depois as críticas. Muitas perguntas. Porquê esta afirmação na página x? E esta na página y? E porquê esta estrutura na página z? E porque não a edição f da crónica h em vez da edição j? Preencho duas folhas com as perguntas. Olho para o relógio e a meia hora passou. Acalmei, mas quando me dão a palavra tropeço nas sílabas. Esperava gaguejar 50 vezes em cada frase. Nada mau, só devo ter gaguejado 40. No final, o João disse que falei muito bem, nem parecia eu. Confesso que me preocupei com este comentário - caramba, devo soar mesmo muito mal no dia-a-dia, a ser assim nem me deixariam dar entrevistas no flash interview da sporttv... Algumas das perguntas foram muito ao lado do que eu tinha previsto. Consegui tratar decentemente uma ou duas, as outras chutei para canto. Ou procurei outros temas, a ver se o tempo entrava nos descontos. Não é jogar para o empate, mas jogar para o empata. Deu certo, confesso... Afinal, se calhar até me safava no flash interview. A meia hora dissolve-se sem eu dar por isso. Todos me diziam que era assim e eu, ingénuo, nunca acreditei.
Terminada a minha meia hora, e depois de uma importante intervenção do meu orientador, que me defendeu melhor do que eu, somos convidados a sair da sala e a esperar o resultado. Estava feito. Disseram-me que o pior momento seria o da espera pela nota. Não acreditei. E comigo não foi verdade. Estava terminado, que importava a nota? Para dizer a verdade, eu nem percebo muito bem se a nota é boa ou média ou mínima. Deveriam numerar estas coisas, porque designações qualitativas são subjectivas... A porta abre-se, sou chamado. a directora do mestrado dá-me os parabéns e anuncia a nota. Agradeço. Nunca sei o que se deve dizer nestas ocasiões. Qual é o comentário adequado? Deveria ter consultado a Paula Bobone, deve haver um capítulo sobre o tema. Pelo menos um parágrafo, não?
Depois foi a descompressão. Sentia-me leve e alegre, como se passeasse por Dublin. O céu voltou a ser azul, os campos verdes e o sol brilhava novamente. Senti-me um recluso de longa duração regressado ao mundo. Ainda perguntei quem era o primeiro-ministro, mas não me disseram. Certamente para não me estragar o momento. A claque de apoio dá-me os parabéns, o meu ex-aluno dá-me quatro abraços (um por cada elemento da família) e vamos à comemoração. Como esta gente é muito recatada e não bebe, optamos pela Coca-cola. É a loucura. Depois é o regresso a casa, acompanhado por uma dor de cabeça que já me tinham avisado que iria aparecer.
E agora? Bem, agora estou livre, livre, livre. Posso ir ao cinema, ler o que me apetece. E posso escrever posts longos como este que está a terminar agora.

1 comentário:

Anónimo disse...

Valeu a pena, então...