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sexta-feira, setembro 15, 2006

Plano de acção para a Matemática

Trata-se da última idiotice inventada pelo ministério da educação. Quanto mais tempo andarão estes totós a inventar soluções para os males que eles próprios criaram, e para os quais não querem aplicar as soluções simples e que iriam funcionar?
Em primeiro lugar, não percebo esta paixão pela matemática. Porque é que a matemática é mais útil do que as outras disciplinas? Mais do que o inglês? Duvido. Do que a História ou as Ciências? Porquê? Se formos a ver bem, só precisa de matemática quem segue a área das ciências. E não adianta dizer que se trata de cultura geral e "mentalidade científica". Então e saber inglês e história não é cultura geral? E não implica uma mentalidade científica? Em termos globais, é muito mais importante ter uma população que sabe inglês (logo, que tem uma ferramenta que permite a sua sobrevivência fora do país e permite educar-se melhor, mesmo cá), do que uma população que sabe matemática. Não falo do básico, das contas, das equações...
Estas políticas ignoram algumas coisas básicas:
1º Em Portugal não há necessidade de muita gente com conhecimento de matemática, porque não há mercado para eles. Há licenciados em matemática no desemprego. O mesmo acontece nas outras áreas científicas, como a biologia e a física. O problema é que o ministério ainda não percebeu que não é por formar mais pessoas que a economia do país se desenvolve, mas é precisamente a evolução económica do país que obriga a população a estudar mais. Saber mais em Portugal não traz, em geral, qualquer benefício. Tivemos um primeiro-ministro engenheiro que não sabia fazer contas. Nos lugares de topo, a começar por muitas escolas e a acabar nos ministérios e empresas, temos gente com baixas qualificações literárias. Em Portugal é mais importante a cunha do que a preparação académica, como bem sabemos. Até porque a preparação académica ministrada em Portugal tem, em muitas áreas, um nível tão baixo que quem a recebe não fica capacitado para triunfar no estrangeiro.
2º Não é possível ensinar matemática (ou o que quer que seja) para turmas sobrelotadas (tenho turma de 9º ano com 30 alunos), por muitas reuniões que se façam sobre o assunto. Seria um passo para começar a enfrentar o problema do mau ensino, mas o ministério é claro ao dizer que "Relembra-se, no entanto, que não é autorizado o desdobramento de turmas e que as escolas que o propuseram deverão pensar em alternativas a este modo de organização, recorrendo designadamente ao reforço de equipas e a assessorias." Mantêm-se assim as turmas gigantes, porque desdobrá-las implica gastar dinheiro.
3º Há muito que não é possível ensinar nas escolas portuguesas, já que estas são locais onde a indisciplina reina, por vontade expressa do ministério, e onde o facilitismo é a regra, também por vontades expressas do ministério. Basta ler a legislação. Um aluno que seja suspenso por indisciplina vê essas faltas serem-lhe justificadas. Um aluno que falte meio ano pode passar porque está dentro da "escolaridade obrigatória". Um aluno com sete ou mais negativas pode e deve passar, a não ser que o conselho de turma demonstre que o seu atraso é tão elevado que ele não conseguirá atingir as competências essenciais de fim de ciclo, uma capacidade de futurologia que ninguém possui. A desmotivação dos alunos é culpa dos professores, o que é estranho quando há alunos motivados pelos mesmos professores. Cada aluno é um caso particular e deve beneficiar de ensino individualizado, fácil de fazer com 30 alunos numa sala, 90 minutos por semana.
4º Não é possível ensinar alunos que não têm noções de disciplina e para quem o trabalho não tem qualquer mérito. Quando ouço na tv a ministra, as associações de pais e os "cientistas" da educação a dizerem que pensam proibir os trabalhos de casa, pergunto como é que se aprende matemática sem praticar em casa? Ou inglês, ou latim, ou grego, ou português? E para quê fazer um esforço para ter boas notas se mesmo tendo más notas a maioria acaba por passar porque a legislação assim o permite? (recordo que as passagens do 1º ano para o 2º são automáticas, mesmo que a criança não saiba ler nem escrever).
5º Como é que querem ensinar matemática a alunos do 5º ao 12º ano, se os quatro anos anteriores, onde começa a sua aprendizagem, são um caos completo? Com esta ânsia de fechar escolas e colocar os alunos todos juntos para "socializarem" e terem um computador na sala, fazem-se turmas que misturam alunos do 1º com os do 2º e até do 3º e 4º ano. Não percebo como é que se pode ensinar assim. Nem em Moçambique, e era um país de terceiro mundo, eu tive na turma alunos de outros anos.
6º Não se pode ensinar quem não quer ser ensinado. E também não se pode ensinar matemática a quem não tem apetência para números. Tenho um amigo que não aprende inglês por muito que tente. Há algo nele, segundo o próprio, que o impede de aprender inglês. As letras irritam-no. É um homem de números. A mim irritam-me os números. Até tive 5 a matemática quando achava piada à coisa. Quando aquilo me parecia útil. Tive uma excelente professora primária (cá em Portugal, evidentemente). Quando cheguei ao 7º ano, perdeu a piada. A prof também não me agradava. Por isso deixei de ligar às aulas e desci para 2. No 8º ano voltei a achar alguma piada e voltei à positiva. No 9º já sabia que não queria saber da matemática para nada. Acabei o ano com positiva, mas tratei de esquecer a maior parte das coisas que me ensinaram. A culpa não foi dos professores que tive, porque alguns dos meus colegas continuaram a ter 5 todos os períodos. Foi minha porque não queria aprender uma coisa que não tinha significado para mim. E quando descobri a Filosofia, adorei. E acho a filosofia mais importante do que a matemática. É a minha opinião. Uma vez, um génio da informática riu-se de um colega que seguiu filosofia: "acho piada a estes cursos que só servem para ensinar outras pessoas a saberem aquilo". Como quem diz, é um curso inútil. É a visão dele. Errada. Mas tal como ele olha assim, muitos alunos olham para a matemática como algo inútil e incómodo, dá trabalho, obriga a pensar e não é divertido. Pensam assim em parte porque são assim, em parte porque os deixaram ser assim.

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