É a tradução literal da biografia de Marc Morris (
A Great and Terrible King. Edward I and the Forging of Britain, Windmill). Eduardo I, o
já nosso conhecido "pernas-longas", não foi o rei-vilão que transparece no filme de Mel Gibson sobre William Wallace. Quando morreu, com mais de setenta anos, Eduardo tinha efectivamente dado grandes passos na direcção da criação da Grã-Bretanha. Herdara um trono inglês débil, enfraquecido pela incapacidade de seu pai fazer frente aos grandes senhores do reino. De forma decisiva (e, aos olhar do século XXI, muitas vezes cruel), o jovem rei domou ou eliminou esses opositores. Depois, conquistou o País de Gales, participou no movimento das cruzadas (um sonho que desejou repetir, sem que tal fosse possível), enfrentou a França pela posse da Gasconha e, por fim, dominou a Escócia (a ascensão de Robert Bruce dar-se-á no reinado do seu incapaz filho e sucessor, Eduardo II).
Por altura da sua morte, os seus contemporâneos cristãos despediram-se de um grande rei. Amigos e adversários elogiaram a sua bravura em combate, a sua inteligência política, a sua eloquência (a dado momento, um dos seus discursos levou um arcebispo às lágrimas). Era um homem crente e piedoso, bafejado pela sorte - salvou-se da morte certa in extremis em várias ocasiões, e nem todas num contexto bélico, talvez graças às muitas relíquias que possuía (entre as quais «um prego da cruz de Cristo e ... o dente de um santo 'eficaz contra relâmpagos e trovões'»). Ao longo da sua vida, Eduardo fez várias peregrinações e viajou bastante. Um pregador descreveu o falecido rei como alguém que «desejava saber muito sobre as mudanças e as diferenças do mundo». «He never knew how to be at rest», concluiu. E realmente, o itinerário de Eduardo choca com a ideia feita de que na Idade Média não se viajava, que se nascia e morria conhecendo apenas um raio muito limitado de território. Eduardo conheceu a Escócia, o País de Gales, a Gasconha, a França, a Flandres, a Itália, a Sicília, a Sardenha; esteve em Espanha, no Norte de África, em Chipre e na Terra Santa.
Intitulado, num epitáfio tardio (mas com possível origem na sua época), "martelo dos escoceses" (Scottorum Malleus Hic Est), também designado, muitos séculos depois, como o Justiniano Inglês, pela grande quantidade de legislação produzida no seu reinado, Eduardo foi extremamente duro para com a população judaica de Inglaterra, que expulsou em 1290 - o feito, terrível para nós, foi elogiado e considerado como um acto louvável de um governante cristão, como consta num dos seus obituários: «he expelled the faithless multitude of Jews and unbelievers from England».
Um grande e terrível rei, em suma, que jaz numa modesta cripta de calcário preto, em Westminster. Idêntica, aliás, à que Eduardo mandara fazer, em Glastonbury, para os restos mortais do mítico Rei Artur.