O tema da morte. Ando com ele desde a mensagem sobre o P. Roth. Vêm à memória as aulas antigas de 12º ano, com os estudos sobre a morte no Antigo Regime. A morte que era vivida ao vivo, em casa. Hoje, nem se ensina a morte, nem se vê a morte, a verdadeira morte, a do corpo que conhecemos com vida a expirar perto de nós. Mortes só em números ou em ficção. Ou escondidas no ambiente dos lares e hospitais, espaços que, em muitas situações, são ante-câmaras funerárias. Fugimos da morte porque cultivamos a juventude? Ou é ao contrário, e o culto da juventude é só um desesperado desejo de imortalidade?
Nestes dias em que pensei nisto em alguns momentos e me lembrei de opiniões que li ou ouvi, dei comigo a concordar mais com a segunda hipótese. A juventude, o culto do corpo, é algo que nos prende ao nascimento, à vida que começou e nos faz esquecer a morte que nos espera. Com a subida da esperança média de vida, hoje identificamos velhice com morte e sentimo-nos mais chocados com a morte de quem era novo. "Youth are diamonds in the sun, and diamonds are forever", cantava uma canção dos anos 80, por sinal intitulada Forever young.
O medo da morte, lembram muitos autores, sempre existiu. Mas o medo físico, instintivo. O outro medo, o que realmente apavora as noites em que os pensamentos se deixam atrair nessa direcção, é mais recente. É o medo do desaparecimento completo. E esse medo floresce em sociedades que já não acreditam na vida após a morte, no conceito de alma e de Deus. Lembrei-me daquele conceito de vida que havia na Idade Média: a vida era uma sofrida peregrinação para expiação de pecados (do pecado original herdado de Eva e Adão) e a morte era a chave para a felicidade eterna no paraíso. Hoje, quando publicidade, ciência, política, ficção e a Walt Disney nos prometem a felicidade na Terra, imediata, adquirível e consumível, materializada em dinheiro e luxo, confundida com amor ou sexo, é mais difícil querer sofrer e morrer. Não foi à toa que a preocupação de uma mãe (história verídica) em relação ao namorado da filha não era haver ou não amor entre eles, mas ele não ter um emprego que garantisse a felicidade dela. A felicidade está ao nosso alcance, não é preciso sofrer, chorar, sobretudo não é preciso esperar. Este imediatismo matou a fé que carregámos durante séculos. E uma sociedade que mata o seu próprio Deus necessariamente não consegue acreditar na imortalidade. Mas pode continuar a sonhar com ela e a negar a sua própria mortalidade.