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quinta-feira, junho 01, 2006

ministra burra

Desculpem lá a franqueza, mas esta é seguramente a ministra mais imbecil que Portugal já teve. E não venham com histórias de exigências. Uma coisa é ser exigente (com o que concordo) e definir um plano rigoroso de avaliação de professores (com o que também concordo, obviamente). Agora, pôr os encarregados de educação a avaliar os professores dos filhos?! Desculpem lá, mas isto não existe em lado nenhum. Como disse o meu irmão (que se riu quando ouviu a notícia, classificando-a como uma idiotice que bateu um record mundial), a coisa fazia sentido, no meu caso, se o encarregado de educação fosse alguém como J. Pacheco Pereira, Vasco Pulido Valente, Rui Ramos ou Marcelo Rebelo de Sousa, entre outros. Isto porque são pessoas com um conhecimento científico bastante superior ao meu na área em que lecciono. Agora os outros... Eis alguns motivos pelos quais discordo totalmente da ideia (peregrina):
1. Os pais não têm, em geral, preparação científica nas áreas curriculares leccionadas - mesmo que sejam, por exemplo, licenciados em História, com que capacidade vão avaliar o desempenho do professor de Matemática, de Ciências ou de Inglês? Ou de Educação Física?
2. Como a maioria dos pais raramente vai à escola (porque não tem horários que o permitam ou porque, mais provavelmente, não o querem fazer) e, obviamente, nao assistem às aulas, a única forma de obterem dados sobre o desempenho dos professores é através do que os filhos contam em casa. Ora, posso garantir que as histórias que as crianças contam não primam pela exactidão factual. Ou seja, a avaliação vai resumir-se a uma conversa de café baseada em boatos e em histórias em segunda mão? Basta a criança não gostar do prof para o pintar de forma negativa ou vice-versa. Em Famalicão escobri que os pais de duas turmas de 9º ano gostavam muito de mim. Algo de estranhar, uma vez que nunca me tinham conhecido. Agora, os alunos gostavam de mim, logo davam boas informações para casa. Só que simpatia ou empatia não é necessariamente sinónimo de competência.
3. Os pais, para além de não terem formação científica nas várias áreas, também não têm formação pedagógica. Dar aulas não é propriamente chegar à sala e ler o manual (quer dizer, em alguns casos até é, mas há gente incompetente em todo o lado). Logo, como é que eles podem avaliar a minha competência ou incompetência pedagógica? É o mesmo que eu avaliar a capacidade técnica de um jogador de futebol ou treinador. Ou de um padeiro ou músico ou escritor. Lá porque gosto da forma como o Leonard Cohen canta, isso não significa que ele seja propriamente um virtuoso. E não suporto o estilo de determinados escritores, mas não sou formado em literatura para avaliar da sua qualidade literária (sim, incluindo o próprio Saramago, embora me pareça um caso demasiado óbvio de incompetência).
Além disso (a ministra falou nos médicos), ninguém dá opiniões sobre como o médico deve operar o apêndice do filho, porque não têm formação para o fazer. O problema é que há áreas que, não sendo propriamente científicas, são técnicas e exigem preparação, mas que são encaradas como coisas do senso comum. É preciso bom senso para dar aulas, mas isso não é suficiente. Também é preciso boa vontade para curar um toxicodependente, mas acreditem que toda a boa vontade do mundo não é suficiente e ele deverá sempre ser encaminhado para especialistas.
4. Os pais podem cair na tentação de avaliar positivamente ou negativamente os professores dos filhos consoante as notas dadas e não propriamente a capacidade de ensinar. É que a positiva nem sempre é mérito do filho, pode ser dada por um prof que não está para se chatear muito. Assim como a negativa pode não ser culpa do prof, já que pode ser a criança que não estuda nem se interessa pela disciplina. Ou pode até interessar-se e não perceber. A inteligência não é a coisa mais bem distribuída do mundo. Eu tive negativa a fisico-química e na altura era mais fácil culpar a prof, mas é sei bem que não estudava e não me interessava por aquela matéria. Era uma coisa que eu não percebia e que não queria esforçar-me para vir a perceber. Um exemplo deste ano. Os profs das turmas A e B do 7º ano são precisamente os mesmos. No 7º A há boas notas, no 7º B mais de metade da turma está em riscos de ficar no mesmo ano. A mãe de um deles já veio dizer que a culpa é nossa, já que, no ano anterior, as notas eram muito melhores. Só não conseguiu explicar o motivo de a outra turma ter bons resultados com profs tão maus como nós somos. Atenção, a maioria dos alunos do 7º B não estuda, muitos não levam livro, outros não levam cadernos, não passam o que está no quadro, não gostam de nenhuma matéria e todos os dias me perguntam se, em vez de dar matéria, se não podemos ir para a biblioteca (leia-se, internet, falar nos chats) ou para a rua. Experimentei a biblioteca, confesso. Dei temas simples para pesquisarem, avisei que não queria plágios da net (expliquei logo o que significa plágio) e fui andando de pc em pc. Quando saía de um, a página da net com o tema era minimizada, e quando eu regressava lá estava o chat ou o hi5 ou as páginas de jogos ou de imagens de personagens dos morangos com açúcar. Entretanto, fomos verificar as notas do ano anterior. De facto eram muito boas, tão boas que não houve uma única negativa a Matemática. Este ano há mais de 50%. A vossa conclusão deve ser a mesma que a minha. Se calhar a falha não está em nós, mas em quem passou as crianças desta forma no ano anterior. Mas aí, asseguro, nenhum pai vem reclamar, desde que o filho tenha positiva. Por fim, pode acontecer (e seguramente vai) que muitos professores, com receio de uma má avaliação por parte dos pais e das possíveis consequências, comecem a inflacionar as notas, coisa que deve ser o principal objectivo do ministério. Lembram-se de ter dito que não se recomendava a reprovação de um aluno que já tivesse ficado retido nesse mesmo ciclo? Pois bem, a lei foi alterada agora (pela mesma ministra que tanto defende a exigência) e diz o seguinte: não é aconselhável a retenção de um aluno que já tenha sido retido alguma vez no seu historial. Ou seja, se a criança está no 8º ano com seis negativas temos de ponderar bem se deve ou ficar chumbar porque já chumbou no 1º ano, ainda o Farense jogava na primeira divisão e o Samora Machel era vivo. Onde está a exigência?
5. Caso a avaliação não incida sobre o desempenho nas aulas (que os pais não conhecem) nem sobre a nossa competência científica ou pedagógica nem sobre as notas dadas, então só poderá incidir na assiduidade dos professores e em alguns comportamentos mais ou menos marginais. Ou seja, se o prof falta muito, se chega atrasado, se passa as aulas a conversar sobre a família, se insulta ou bate nos alunos, se é apanhada com outra professora aos beijos e em actos homossexuais na casa de banho da escola, se se embebeda ou consome drogas, se atende o telemóvel na sala de aula, se assedia as crianças, se diz asneiras nas aulas, se tem pulgas, piolhos ou as calças manchadas com urina de cão ou se pede a um aluno para tirar a pila para fora para mostrar às alunas o que é a erecção masculina (não inventei nenhum caso dos que aqui estão, atenção). Pois bem, de acordo que são todos reprováveis e merecedores de punição, consoante a maior ou menor gravidade. Mal por mal, prefiro alguém que falte do que um que assedie as crianças. Quanto ao prof das pulgas e calças com urina de cão, tirando o efeito negativo do cheiro, era considerado um excelente professor por alunos dele que eu conheço e que são fonte de confiança. Acontece que os pais podem denunciar estas situações, mas não cabe a eles avaliar e puni-las. Há órgãos próprios da escola, como o conselho executivo e o conselho pedagógico, há a inspecção escolar, as direcções regionais ou o ministério da educação, para onde pais, alunos, funcionários e outros professores podem e devem recorrer, com denúncias e queixas. E, para os casos criminosos, há a polícia judiciária.
Por estas razões, que julgo terem fundamento, considero a ideia perfeitamente idiota, não tem outra adjectivação. Só pode ter dois objectivos: é uma forma de forçar os professores a inflacionar as notas e / ou é uma forma de dividir para reinar. Note-se que esta ideia é há muito defendida pela confederação de associações de pais, um lobbie tão ou mais poderoso que os sindicatos que andam a minar, cada um da sua forma, a qualidade de ensino em Portugal. E, obviamente, esqueci-me de sublinhar o óbvio: não são os encarregados de educação, individualmente, que vão avaliar os professores, mas as associações de pais. Estas têm, muitas vezes, relações bastante conflituosas com executivos e professores (pelo menos foi o que verifiquei em algumas escolas onde essas associações existiam) e querem este novo cargo para resolver algumas divergências mais ou menos pessoais que têm com o corpo de professores efectivos da escola.
Claro que não sou pai, pelo que não tenho a perspectiva deles. Que dizem vocês, que estão mais "fora" desta questão e podem ser mais imparciais?
nota: nada disto contraria o que disse antes: deve haver avaliação de professores, tal como há em todo o mercado de trabalho; deve haver maior exigência e melhor qualidade de ensino; mas isso não se obtém com críticas e leis que nada resolvem. A ministra disse que o ensino secundário não pode formar só para o acesso à universidade. Que resolva o problema, então, (re)criando as escolas profissionais. Se que melhor educação dos alunos (o que não significa melhores notas e menor insucesso escolar nas estatísticas), que retome leis básicas sobre punição da indisciplina e reponha as regras mínimas de exigência na avaliação: não se pode ser exigente e, ao mesmo tempo, tentar impedir que um aluno que chumbou no quaternário ou no mezozóico volte a chumbar, apesar de não estar preparado para ter sucesso no ano seguinte. Isso não produz mais sucesso, destrói futuros e cria um mercado de trabalho ilusoriamente instruído, repleto de analfabetos funcionais que soletram em vez de ler, que usam calculadoras me vez de fazer contas, que não escrevem sem erros e que pedem, no 9º ano, se o prof pode dar um sinónimo de Singapura...

1 comentário:

Anónimo disse...

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