
Não há outra imagem, outra pessoa que tenha esse efeito. Talvez as bem compostas fotos das actrizes dos anos 30 e 40, essas quase chegam a provocar esse efeito. Mas não provocam. Porque só aquele rosto é assim. Perfeito. Para mim. Quem me conhece há muito tempo, deve lembrar-se que incessantemente rabiscava tudo quanto era papel branco. Ainda hoje o faço. E o resultado era sempre o mesmo, um rosto. O mesmo rosto, com variantes, com evoluções, como se procurasse o rosto perfeito, como se procurasse um rosto que em tempos, numa outra vida (se acreditarem em outras vidas, porque não?), eu tenha admirado e amado. Um rosto que me tenha dado vida ou causado a morte, um rosto que me tenha encantado, que tivesse a parte de mim que estava incompleta, que soava a oco quando lhe tocavam...
A primeira vez que vi o rosto da Angelina Jolie, em pleno Tomb Raider, percebi que era aquele o rosto que eu procurava. Não era o da Vénus de Botticelli (mas que crime não existir ainda fotografia naquele tempo, como seria o rosto que serviu de inspiração para aquele retrato?). Não o das mulheres de Milo Manara, apesar dos seus caracóis perfeitos e dos seus lábios bem desenhados. Era aquele rosto que me olhava do ecran. Provavelmente já o teria visto antes, mas só nessa altura o vi com a força que ele tinha. E todo o filme para mim foi uma busca incessante de novas expressões, uma contínua descoberta de encantos, maravilhas, sorrisos e alegria incontida. Ali estava, depois de tanto tempo, o rosto perfeito. Para mim, aquele filme teria sido uma experiência da nova vaga, 90 minutos de close up, não importava qual fosse a acção a decorrer. Apenas o rosto, 90 minutos de retrato vivo, os olhos nas suas expressões vivas, sedutoras, os trejeitos da boca, a ternura dos lábios unidos em amuos de fim de palavras... Se eu realizasse aquele filme, seria despedido. Seria incompreendido. Ou ganharia prémios em Cannes. Não importa. Teria o meu filme, a minha obra, o mais próximo que poderia ficar da obra-prima, da obra-única. Teria o meu rosto, para ver vezes sem conta, numa sala escura... Já não precisaria de o desejar (saiu-me assim a palavra, queria escrever desenhar e saiu desejar, acreditam nisto? até os meus dedos falam por mim), já não tinha de o procurar em todas as telas brancas de papel que encontro e rabisco em qualquer lugar em que me encontre...
3 comentários:
um rosto é sempre uma ilusão. terás de escarafunchar por dentro do rosto para encontrar a ilusão da verdade.
Mas a verdade é que também não há maneira de se escapar à necessidade da ilusão quando se usam as palavras, sempre criadoras de um universo virtual.
O trabalho do artista consiste em descobrir os mecanismos de desencadeamento de energia, a energia da "sensação verdadeira".
mas será possível encontrar a linguagem capaz de representar a natureza sem a intermediação do pensamento, dizer as palavras de antes dos discursos?
Toda a verdade é contraditória.
A perfeição deste e de outros rostos de Hollywood deve-se a cirurgia plastica! Gpstei do texto, porem!
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