- Sempre é verdade que o odeias?
- Não sei se o odeio, mas é certo que o detesto.
- Há quem diga que é boa pessoa.
- Sim, no fundo, no fundo, com o tempo... Há quem diga que sim, que nos vamos apercebendo disso.
- E não acreditas?
- Acreditei, a princípio. Mas o tempo foi passando, já lá vão uns anos e continua a ser a criatura detestável do início. Quão subtil poderá ser a bondade do homem, e quão tímida, para tardar tanto tempo em mostrar-se?
- Mas detestas o homem porquê?
- Oh, tanta coisa. Às vezes penso sobre isso e parte de mim diz "exageras!", mas logo o que resta de mim começa a desfiar o novelo do que está para trás e o exagero já não parece uma explicação plausível.
- Compreendo.
- Ainda no outro dia estive a pensar na morte dele. Como será que eu reagiria? Sobretudo, como reagiria perante os choros dos outros no funeral, hipócritas ou sentidos?
- No funeral? E não serias tu também hipócrita indo ao funeral?
- O pensamento ocorreu-me. Não. Os outros, que sabem o que penso e o que sinto, provavelmente olhar-me-iam e comentariam "olha só o hipócrita, a fazer de conta que está pesaroso com o que aconteceu", mas enganar-se-iam. Na verdade, eu estaria (ia dizer estarei, mas emendei a tempo) no funeral só para me certificar que enterravam mesmo o filho da puta.
1 comentário:
Que exagero!!!
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